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Historico de livros publicados ....
1 amanhecer - Stephenie Meye e logo em baixo alguns cáps.Sussurro - Becca P.,
EM BREVE: Alyson Noël 03 - Shadowland' TERRA DAS SOMBRAS "















             Amanhecer - Stephenie Meyer




LIVRO 1: BELLA


Infância não é a partir do nascimento com certa idade para uma certa idade. A criança se torna um adulto, e esquece das coisas infantis. A infância é o reino onde ninguém morre.

– Edna St. Vincent Millay




Prólogo

Eu já tive muito mais experiências de quase morte do que era necessário, isso não é exatamente uma coisa a qual você se acostuma.
No entanto, enfrentar a morte novamente parecia estranhamente inevitável. Como se eu realmente estivesse marcada pelo desastre. Eu escapei vez após outra, mas ela continuava vindo atrás de mim.
Ainda assim, essa vez era tão diferente das outras.
Você pode correr de alguém que você teme, você pode tentar lutar com alguém que você odeia. Todas as minhas reações eram direcionadas a esses tipos de assassinos — os monstros, os inimigos.
Quando você ama a pessoa que está te matando, não te restam opções. Como você poderia correr, como você poderia lutar, quando fazer isso machucaria o seu amado? Se sua vida fosse tudo o que você tem a dar ao seu amado, como você seria capaz de não dá-la?

Se fosse alguém a quem você realmente ama?


                                                   
                                                Capítulo 1 – Noivos


  - Ninguém está te encarando”, eu prometi a mim mesma. - Ninguém está te encarando. Ninguém está te encarando.
Mas, como eu não conseguia mentir convincentemente nem para mim mesma, eu precisei dar uma checada. Sentada esperando que os três semáforos da cidade ficassem verdes, eu olhei para a direita — em sua minivan, a Sra. Weber tinha virado o tórax inteiro em minha direção. Os olhos dela penetraram nos meus, e eu me inclinei pra trás, me perguntando por que ela não desviou o olhar ou pareceu envergonhada. Ainda era considerado rude encarar as pessoas, não era? Será que essa regra não era mais usada?

Foi ai que me lembrei que essas janelas eram tão escuras que ela provavelmente nem tinha idéia de que eu estava aqui, muito menos de que eu tinha pego ela olhando. Eu tentei encontrar algum conforto no fato de que ela não estava realmente olhando pra mim, apenas para o carro.
Meu carro. Suspiro. Eu olhei para a esquerda e gemi. Dois pedestres estavam congelados na calçada, perdendo a chance de atravessar a rua enquanto olhavam. Atrás deles, o Sr. Marshall estava espiando através da janela de vidro de sua pequena loja de souvenirs. Pelo menos o nariz dele não estava pressionado contra o vidro.


Ainda.
  O semáforo ficou verde e, na minha pressa de escapar, eu pisei no acelerador sem pensar — a forma normal que eu teria pisado pra fazer a minha velha caminhonete Chevy sair do lugar. Com o motor urrando como uma pantera, o carro saltou rapidamente pra frente que o meu corpo bateu no banco de couro preto, e meu estômago se comprimiu contra a minha espinha.
   - Arg!” Eu resfoleguei enquanto procurava pelo freio. Usando a cabeça, eu apenas toquei no pedal. O carro parou completamente mesmo assim. Eu não agüentei olhar ao redor pra ver as reações. Se antes havia alguma duvida sobre quem estava dirigindo este carro, agora já não existia. Com a ponta do meu sapato, eu gentilmente baixei um centímetro do acelerador, e o carro seguiu em frente novamente.
Eu consegui chegar onde queria, o posto de gasolina. Se eu não estivesse enlouquecendo, eu não precisaria ter que vir á cidade. Eu estava me virando sem um monte de coisas ultimamente, como Pop-Tarts e cadarços, pra evitar ficar em público.
Me movendo como se eu estivesse numa corrida, eu abri o tanque, tirei a capa, passei o cartão, e coloquei a mangueira no tanque em questão de segundos. É claro, não havia nada que eu pudesse fazer para que os números na bomba de gasolina andassem mais rápido. Eles estalavam fazendo barulhos, quase como se estivessem fazendo aquilo pra me aborrecer.
  O dia não estava bonito — um típico dia chuvoso em Forks, Washington — mas eu ainda sentia como se um ponto se luz estivesse focado em mim, atraindo atenção para o delicado anel na minha mão esquerda. Em vezes como essa, sentindo os olhos nas minhas costas, eu me sentia como se o anel estivesse piscando feito um anúncio em néon: Olhe para mim, olhe para mim.
Era estúpido me sentir envergonhada, e eu sabia disso. Além do meu pai e da minha mãe, será que realmente importava o que as pessoas estavam dizendo sobre o meu noivado? Sobre o meu carro novo? Sobre a minha misteriosa entrada para a Ivy League? Sobre o meu cartão de crédito preto e brilhante que parecia tingido de vermelho no meu bolso de trás nesse exato momento?

  - É, quem se importa com o que eles pensam?” Eu murmurei em voz baixa.
 
  - Hm, senhorita?” a voz de um homem chamou.
Eu me virei, e então desejei não ter feito isso.
Dois homens estavam parados ao lado de um jipe chique com caiaques novinhos amarrados no topo. Nenhum deles estava olhando para mim; os dois estavam olhando para o carro.
Pessoalmente, eu não entendi. Mas eles, eu estava orgulhosa de saber distinguir os símbolos entre Toyota, Ford e Chevy. Esse carro preto escuro, brilhante, e bonito, mas para mim era só um carro.

  - Eu lamento incomodar, mas será que você pode me dizer que carro é esse que você está dirigindo?” o mais alto me perguntou.

“Um, Mercedes, não é?”

“Sim”, o homem disse educadamente enquanto seu amigo mais baixinho rolava os olhos com a minha resposta. “Eu sei. Mas eu estava me perguntando, essa é... Você está dirigindo uma Mercedes Guardian?” O homem disse o nome com reverência. Eu tive a sensação de que esse homem se daria bem com Edward, meu... meu noivo (realmente não havia como fugir dessa verdade com o casamento a apenas alguns dias de distância). “Eles ainda nem estão disponíveis na Europa” o homem continuou. “Muito menos aqui”.

Enquanto os olhos dele traçavam os contornos do meu carro — pra mim ele não parecia diferente dos outros sedans Mercedes, mas o que eu sabia? — eu pensei brevemente nos meus problemas com palavras como noivo, casamento, marido, etc.
  Eu simplesmente não conseguia coloca-las juntas na minha cabeça.
Por outro lado, eu fui criada pra me contorcer só de pensar nos vestidos brancos e volumosos e nos buquês. Mas mais do que isso, eu simplesmente não conseguia conciliar um conceito estável, respeitável, e chato de marido com o meu conceito de Edward. Era como comparar um arcanjo com um contador; eu não conseguia imagina-lo no papel de uma pessoa normal.
Como sempre, assim que eu comecei a pensar em Edward eu fiquei presa em um vendaval de fantasias delirantes. O estranho precisou limpar a garganta para chamar a minha atenção; ele ainda estava esperando uma resposta sobre o modelo e fabricação do meu carro.

“Eu não sei”, eu o disse honestamente.

“Você se importa se eu tirar uma foto com ele?”

Eu levei alguns segundos para processar isso.

“Sério? Você quer tirar uma foto com o carro?”

“Claro — ninguém vai acreditar em mim se eu não tiver uma prova.”

“Um. Okay. Tudo bem.”

Eu rapidamente me desfiz da mangueira e me enfiei no banco da frente para me esconder enquanto o entusiasta tirava uma câmera grande, de aparência profissional da bolsa. Ele e seus amigos fizeram pose no capô, e então foram tirar fotos na traseira.


“Eu sinto falta da minha caminhonete”, eu sussurrei para mim mesma.

Muito, muito conveniente — conveniente demais — que minha caminhonete fizesse seus últimos barulhos apenas algumas semanas depois de Edward e eu termos firmado um compromisso, um detalhe que significava que ele podia repor a minha caminhonete quando ela passasse dessa para uma melhor.
  Edward jurou que isso já era de se esperar, pois minha caminhonete viveu uma vida longa e cheia e então morreu de causas naturais. Isso é o que ele diz. E, é claro, eu não tive como verificar a história que ele contou nem tentar trazer minha caminhonete de volta á vida por conta própria. Meu mecânico favorito...
Eu parei aquele pensamento imediatamente, me recusando a deixar que ele chegasse ao fim. Ao invés disso, eu ouvi as vozes dos homens do lado de fora, abafadas pelas paredes do meu carro.

“... ele foi em frente com uma chama na descarga naquele vídeo on-line. A tintura nem ficou queimada.”

“É claro que não. Você pode passar com um tanque em cima desse bebê. Isso não é muito negócio pra ninguém daqui. Ele foi designado em maioria pra diplomatas do Oriente Médio, traficantes de armas e de drogas.”

“Você acha que ela é alguém importante?” o baixinho perguntou com uma voz mais suave. Eu abaixei minha cabeça.

“Huh”, o alto disse. “Talvez. Não posso imaginar porque você precisaria de vidros á prova de mísseis e quatro mil quilos de proteção corporal num lugar como esse. Ela deve estar indo para algum lugar mais perigoso.”
Proteção corporal. Quatro mil quilos de proteção corporal. E vidros com blindagem á prova de mísseis? Legal. O que aconteceu com as velhas blindagens á prova de tiros?
Bom, pelo menos isso fazia sentido — se você tinha um senso de humor bastante doentio.
Não era como se eu não esperasse que Edward tirasse vantagem do nosso acordo, só pra balancear as coisas a seu favor pra que ele tivesse que dar muito mais do que ele receberia. Eu concordei que ele trocasse a minha caminhonete quando ela precisasse de reparos, sem esperar que isso acontecesse tão em breve, é claro. Quando eu fui forçada a admitir que a minha caminhonete havia se transformado num tributo de metal aos Chevys clássicos, eu sabia que a idéia dele de troca ia me envergonhar. Tornar-me-ia foco de olhares e sussurros. Mas nem nas minhas imaginações mais obscuras eu previ que ele me compraria dois carros.
O carro “de antes” e o carro “de depois”, ele me explicou enquanto eu dava uma volta.
O carro “de antes” eledisse que era um empréstimo e me prometeu que o devolveria depois do casamento. Isso tudo não fazia nenhum sentido pra mim.

Até agora.
Ha ha. Como eu era uma humana tão frágil, tão propensa a acidentes, tão vítima da minha própria perigosa falta de sorte, aparentemente eu precisava de um carro que fosse resistente a um tanque pra me manter segura. Hilário. Eu tinha certeza de que ele e seus irmãos gostaram bastante da piada pelas minhas costas.


Ou talvez, apenas talvez, uma pequena voz sussurrou na minha cabeça, não seja uma piada, bobinha. Talvez ele realmente esteja muito preocupado com você. Essa não seria a primeira vez que ele passou um pouco dos limites tentando me proteger.
Eu suspirei.

Eu ainda não vi o carro “de depois”. Ele o escondeu embaixo de uma capa no canto mais distante da garagem dos Cullen. Eu sei que a maioria das pessoas já teria espiado a essa altura, mas eu realmente não queria saber. Provavelmente não havia proteção corporal naquele carro — porque eu não precisaria de proteção depois da lua de mel. Indestrutibilidade quase literal era uma das coisas pelas quais eu estava esperando. A melhor parte de ser um Cullen não era ter carros caros e cartões de créditos impressionantes.

“Hey”, o homem alto chamou, colocando as mãos no vidro no esforço de espiar do lado de dentro. “Nós já acabamos. Muito obrigado!”

“De nada” eu respondi, e então fiquei tensa enquanto ligava o motor e apertava o acelerador — muito delicadamente — pra baixo.
Não importava quantas vezes eu dirigisse na estrada familiar no caminho pra casa, eu ainda não conseguia fingir que os pôsteres molhados da chuva não estavam lá. Cada um deles, pregado em postes telefônicos e colados em placas de rua, era como um tapa de luz no rosto. Um tapa bem merecido. Minha mente era sugada de volta ao pensamento. Eu o havia interrompido tão rapidamente antes. Eu não consegui evitar isso nessa rua. Agora, com as fotos do meu mecânico favorito passando rapidamente por mim em intervalos regulares.


Meu melhor amigo. Meu Jacob.

Os pôsteres de VOCÊ VIU ESSE GAROTO? Não foram idéia do pai de Jacob. Foi o meu pai, Charlie, quem imprimiu os panfletos e os espalhou por toda a cidade. E não apenas em Forks, mas em Port Angeles e Sequim e Hoquiam e Aberdeem e em todas as cidades da Península Olímpica... Ele cuidou para que todas as delegacias em todo o estado de Washington tivessem o mesmo panfleto em suas paredes também. Sua própria delegacia tinha um quadro inteiro dedicado a encontrar Jacob também. Um quadro que estava quase inteiramente vazio, pra sua decepção e frustração.
Meu pai estava decepcionado com muito mais do que a falta de resposta. Sua maior decepção era com Billy, o pai de Jacob — e o amigo mais próximo de Charlie.
Por causa da falta de envolvimento de Billy no desaparecimento do seu “fugitivo” de dezesseis anos. Porque Billy se recusou a colocar os panfletos em La Push, a reserva na costa que era a casa de Jacob. Porque ele parecia estar resignado com o desaparecimento de Jacob, como se não houvesse nada que ele pudesse fazer. Por ele dizer “Jacob é crescido agora. Ele voltará pra casa quando ele quiser.”
E ele estava frustrado comigo por ficar do lado de Billy. Eu também não pendurei panfletos. Porque tanto eu quanto Billy sabíamos onde Jacob estava, figuradamente falando, e nós também sabíamos que ninguém tinha visto esse garoto.
Os panfletos colocaram aquele caroço de costume na minha garganta, as lágrimas de costume nos meus olhos, e eu fiquei feliz por Edward estar viajando em caça nesse Sábado. Se Edward visse a minha reação, isso o faria se sentir terrível também.
É claro, haviam pontos ruins em ser sábado. Enquanto eu virava lentamente em minha rua, eu podia ver a viatura policial do meu pai na entrada de casa.
Ele deixou a pescaria de lado hoje de novo. Ainda fazendo beicinho pelo casamento.
Então eu não seria capaz de usar o telefone lá dentro. Mas eu precisava ligar...
Eu estacionei na curva, atrás da escultura de Chevy e peguei o telefone que Edward me deu para emergências no porta luvas. Eu disquei, mantendo o meu dedo no botão “end”. Só pela dúvida.
“Alô?’ Seth Clearwater atendeu, e eu suspirei aliviada.




Eu era covarde demais pra falar com sua irmã mais velha, Leah. A frase “me morda” não era exatamente uma figura de expressão quando se tratava de Leah.



“Hey, Seth, é Bella”.

“Oh diz aê, Bella! Como você está?”

Chocada. Desesperada por notícias.



“Bem.”

“Ligando por notícias?”

“Você é um vidente.”

“Dificilmente. Eu não sou nenhuma Alice — só que você é previsível”, ele brincou. Entre o bando Quileute de La Push, Seth era o único que se sentia confortável de sequer mencionar o nome dos Cullen, quanto mais fazer piada sobre a minha futura cunhada que sabia praticamente tudo.

“Eu sei que sou” Eu hesitei por um minuto. “Como ele está?”

Seth suspirou.



“Como sempre. Ele não fala, apesar de sabermos que ele nos ouve. Ele está tentando não pensar como humano, sabe. Apenas com os instintos”.

“Você sabe onde ele está agora?”

“Algum lugar ao norte do Canadá. Eu não sei te dizer em que província. Ele não presta muita atenção em limites estaduais.”

“Alguma dica de que ele possa...”

“Ele não vai voltar pra casa, Bella. Desculpa.”

Eu engoli.



“Tudo bem, Seth. Eu já sabia antes de ter perguntado. Eu não posso evitar esperar.”

“É. Nós nos sentimos do mesmo jeito.”

“Obrigada por me informar, Seth. Eu sei que os outros devem dificultar as coisas pra você.”

“Eles não são os seus maiores fãs” ele concordou alegremente. “Meio bobo, eu acho. Jacob fez as escolhas dele, você fez as suas. Jake não está gostando das atitudes deles. É claro que ele também não está super feliz por você estar recebendo notícias dele.”

Eu resfoleguei.



“Eu pensei que ele não estivesse falando com vocês.”

“Ele não consegue esconder tudo de nós, mesmo estando tentando muito.”

Então Jacob sabia que eu estava preocupada. Eu não tinha certeza de como me sentia em relação a isso. Bom, pelo menos ele sabia que eu não havia caminhado em direção ao pôr do sol e esquecido dele completamente. Ele podia ter me imaginado capaz de fazer isso.

“Eu acho que te vejo no... casamento.” Eu disse, forçando a palavra entre os meus dentes.

“É, eu e minha mãe estaremos lá. Foi legal da sua parte nos convidar.”

Eu sorri pelo entusiasmo na voz dele. Apesar de que convidar os Clearwater tenha sido idéia de Edward, eu estava feliz por ele ter pensado nisso. Ter Seth lá seria legal — uma conexão, mesmo que tenaz, ao meu padrinho desaparecido.



“Não seria o mesmo sem você”.

“Diga a Edward que eu mandei um oi, ok?”

“Com certeza”.

Eu balancei minha cabeça. A amizade que surgiu entre Edward e Seth era uma coisa que ainda confundia a minha mente. Era uma prova, no entanto, de que as coisas não precisavam ser daquele jeito. Que lobisomens e vampiros podiam se dar muito bem, muito obrigada, se eles quisessem isso.

Nem todo mundo gostava dessa idéia.

“Ah”, Seth disse, sua voz aumentando uma oitava. “Leah está em casa.”

“Oh! Tchau!”
O fone ficou mudo. Eu o deixei no assento e me preparei psicologicamente para entrar em casa, onde Charlie estaria esperando. Meu pobre pai tinha que lidar com muitas coisas agora. O sumiço de Jacob era apenas um doas fardos que ele tinha que levar em suas costas sobrecarregadas. Ele estava quase tão preocupado quanto eu sobre a minha transformação em uma Sra. em apenas alguns dias.


Eu caminhei lentamente através da chuva fraca, lembrando da noite em que contamos a ele.



Enquanto o som da viatura de Charlie anunciava a sua chegada, o anel de repente pesou cem quilos na minha mão. Eu queria enfiar a minha mão esquerda no bolso, ou talvez sentar nela, mas o aperto calmo e firme de Edward a manteve á frente e ao centro.

“Não fique nervosa, Bella. Por favor tente lembrar que você não está confessando um assassinato”.

“Fácil pra você dizer”

Eu ouvi o conhecido som das botas do meu pai batendo na calçada. A chave girou na porta já aberta. A porta bateu contra a parede e eu enrijeci como se tivesse levado um choque.

“Acalme-se, Bella,” Edward suspirou, ouvi meu coração acelerar.

A porta bateu contra a parede, e como eu me movi bruscamente como se tivesse sendo presa.

“Hey, Charlie”, Edward falou inteiramente relaxado.

“Não!” Eu assoviei baixinho.

“O que foi?” Edward sussurrou de volta.

“Espere até ele guardar a arma!”

Edward gargalhou e passou sua mão livre pelo seu cabelo cor de bronze bagunçado.

Charlie apareceu na curva, ainda usando seu uniforme, ainda armado, e tentando não fazer uma careta quando viu nós dois sentados juntos no sofá.

Ultimamente ele estava se esforçando bastante pra gostar mais de Edward. É claro, aquela revelação certamente iria acabar com esses esforços.

“Olá, garotos. O que está havendo?”

“Nós gostaríamos de conversar com você” Edward disse. “Nós temos boas notícias”.

A expressão de Charlie foi de forçadamente amigável á suspeitas obscuras em um segundo.

“Boas notícias?” Charlie urrou, olhando diretamente pra mim.
“Sente-se pai”


Ele ergueu uma sobrancelha, me encarou por cinco segundos, e aí foi até a cadeira reclinável e se sentou bem na pontinha, suas costas estavam retas como um pedaço de pau.

“Não fique nervoso, pai” Eu disse depois de um momento de silêncio forçado.

“Está tudo bem.”

Edward fez uma careta, e eu sabia que isso era uma objeção a palavra bem.

Ele provavelmente teria usado algo parecido com maravilhoso ou perfeito ou glorioso.

“Claro que sim, Bella. Claro que sim. Se está tudo bem porque você está suando como um porco?”

“Eu não estou suando”, eu menti.

Eu me desviei de sua careta penetrante, me apertando contra Edward, e instintivamente passei a mão direita pela minha testa para apagar as evidências.

“Você está grávida!” Charlie explodiu. “Você está grávida, não está?”

Apesar da pergunta provavelmente ser pra mim, agora ele estava olhando pra Edward, e eu podia jurar que vi a mão dele se fechando na arma.

“Não! É claro que eu não estou!”
Eu queria dar uma cotovelada nas costelas de Edward, mas eu sabia que isso ia me deixar com um hematoma. Eu disse a Edward que as pessoas iam imediatamente chegar a essa conclusão! Que outra razão possível pessoas sãs se casariam aos dezoito anos? (A resposta dele a isso me fez revirar os olhos. Amor. Certo.)


O olhar de Charlie limpou um pouco. Geralmente ficava muito claro no meu rosto quando eu estava falando a verdade, e agora ele acreditava em mim.

“Oh, desculpe.”

“Desculpas aceitas.”

Houve uma longa pausa. Depois de um momento eu percebi que todos estavam esperando que eu dissesse alguma coisa. Eu olhei pra Edward, paralisada de pânico. Não tinha jeito de me fazer botar as palavras pra fora.

Ele sorriu pra mim e enquadrou os ombros e então se virou para meu pai.

“Charlie, eu sei que as coisas estão fora de ordem. Tradicionalmente, eu devia ter te pedido antes. Eu não tenho a intenção de te desrespeitar, mas já que Bella já disse sim e eu não quero menosprezar a escolha dela nesse assunto, ao invés de te pedir a mão dela, eu te peço sua benção. Nós vamos nos casar, Charlie. Eu a amo mais do que tudo no mundo, mais do que a minha própria vida e — graças a algum milagre — ela me ama da mesma forma. Você nos dará a sua benção?”

Ele soou tão seguro, tão calmo. Por apenas um instante, escutando àquela absoluta certeza na voz dele, eu experimentei um raro momento de insight. Eu pude ver, rapidamente a forma que todos olhavam pra ele. Durante um bater de coração, esta noticia fez total sentido.

E ai eu vi o rosto inexpressivo de Charlie, os olhos dele agora estavam grudados no anel.

Eu prendi a respiração enquanto a pele dele mudava de cor — de normal a vermelha, de vermelha a roxa, de roxa a azul, eu comecei a me levantar — eu não sei o que eu estava planejando fazer; talvez fazer a manobra Heimlich pra ter certeza de que ele não estava engasgando — mas Edward apertou minha mão e murmurou “Dê um minuto a ele” tão baixinho que só eu pude ouvir.
Dessa vez o silêncio foi muito mais longo. Então, gradualmente, tom por tom, a cor de Charlie voltou ao normal. Os lábios dele se comprimiram, e suas sobrancelhas se uniram; eu reconheci sua expressão “pensando profundamente”. Ele estudou nós dois por um longo momento, e eu senti Edward relaxar ao meu lado.

“Acho que não estou tão surpreso”, Charlie murmurou. “Eu sabia que teria eu lidar com isso em algum momento em breve”.
Eu soltei o ar.
“Você está certa disso?” Charlie quis saber, me encarando.

“Eu tenho cem por cento de certeza de Edward” eu o assegurei sem perder tempo.

“Mesmo assim, se casar? Por que a pressa?” Ele me olhou com suspeitas novamente.

A pressa era porque eu estava me aproximando dos dezenove anos a cada dia que se passava, enquanto Edward ficava congelado em sua perfeição dos dezessete anos. Não que esse fato se associasse a casamento no meu livro, mas o casamento era necessário devido a um delicado e complicado compromisso que Edward e eu temos pra chegar a esse ponto, o tijolo que leva a qualquer transformação de mortal a imortal. Essas eram coisas que eu não podia explicar a Charlie.
“Nós estamos indo para Dartmouth juntos no outono, Charlie”, Edward lembrou ele. “Eu gostaria de fazer isso, bem, da forma correta. Foi assim que eu fui criado”. Ele encolheu os ombros.


Ele não estava exatamente exagerando; eles tinham moral antiquada durante a primeira guerra mundial.

A boca de Charlie torceu para um lado. Procurando por alguma coisa com a qual discutir. Mas o que ele podia dizer? Eu preferiria que você vivesse pecaminosamente primeiro? Ele era um pai; suas mãos estavam atadas.

“Eu sabia que isso aconteceria”, ele murmurou pra si mesmo, fazendo uma careta. Então, de repente, seu rosto ficou perfeitamente suave e desanuviado.

“Papai?” Eu perguntei ansiosamente. Eu olhei pra Edward, mas eu também não consegui ler seu rosto, enquanto ele olhava pra Charlie.

“Ha!” Charlie explodiu. Eu pulei no meu assento. “Ha, ha, ha!”

Eu o encarei incredulamente enquanto Charlie de dobrava de tanto rir, seu corpo todo de balançando.

Eu olhei pra Edward para ter uma tradução, mas os lábios de Edward estavam fechados com força, como se ele mesmo estivesse tentando segurar o riso.

“Okay, está certo.” Charlie tossiu. “Se casem” Outra onda de risos o balançou. “Mas...”

“Mas o quê?” Eu quis saber.

“Mas você precisa contar a sua mãe! Eu não vou dizer uma palavra a Renée!

Isso é por sua conta!” Ele explodiu em risadas escandalosas.

Eu parei com a mão na maçaneta, sorrindo. Claro, naquele tempo, as palavra dele me aterrorizaram. O destino final; contar a Renée. Casamento durante a juventude estava na lista negra dela acima de matar filhotes de cãezinhos.


Quem podia ter adivinhado a reação dela? Eu não. Certamente não Charlie.

Talvez Alice, mas eu não pensei em pergunta-la.

“Bem, Bella”, Renée disse depois que eu tossi e gaguejei as palavras impossíveis: Mamãe, eu vou casar com Edward. “Eu estou um pouco aborrecida por você ter demorado tanto pra me contar. Passagens de avião estão ficando mais caras. Ohhhh”, ela temeu. “Você acha que Phil já vai ter tirado o gesso até lá? Se ele não estiver usando terno isso vão arruinar as fotos...”



“Espera um segundo, mãe”, eu resfoleguei. “O que você quer dizer com esperar tanto tempo? Eu acabei de no-no...” — eu não fui capaz de botar a palavra noivar pra fora —“acertar as coisas, sabe, hoje.”

“Hoje? Mesmo? Isso é uma surpresa. Eu suspeitei...”

“O que você suspeitou? Quando você suspeitou?”

“Bem, quando você veio me visitar em Abril, parecia que as coisas já estavam arranjadas, se é que você sabe o que eu quero dizer. Você não é muito difícil de ler, queridinha. Mas eu não quis dizer nada, porque eu sabia que não tinha utilidade nenhuma. Você é exatamente como Charlie.” Ela suspirou, resignada. “Quando você resolve uma coisa, não tem como tentar ser razoável com você. É claro, assim como Charlie, você mantém a sua decisão também.”
E então ela disse a última coisa que eu nunca esperava ouvir da minha mãe.


“Você não está repetindo os meus erros, Bella. Você parece estar assustada bobinha, e eu acho que seja porque você estava com medo de mim”. Ela gargalhou. “Ou do que eu vou pensar. E eu sei que eu disse um monte de coisas sobre o meu casamento e a minha estupidez – e eu não vou morder minha língua – mas você precisa entender que aquelas coisas se aplicavam especificamente a mim. Você é uma pessoa completamente diferente de mim. Você comete os seus próprios tipos de erros, e eu tenho certeza que você terá a sua parcela de arrependimentos na vida. Mas compromisso nunca foi o seu problema, queridinha. Você tem uma chance melhor de fazer isso funcionar do que muitas quarentonas que eu conheço”. Renée sorriu de novo. “Minha pequena criança de meia idade. Por sorte, parece que você encontrou outra alma de meia idade .”

“Você não está... com raiva? Você não acha que eu estou cometendo um erro gigantesco?”

“Bem, eu com certeza gostaria que você esperasse mais alguns anos. Quer dizer, você acha que eu pareço velha o suficiente pra ser uma sogra? Não responda. Mas isso não se trata de mim. Você está feliz?”

“Eu não sei. Eu estou tendo uma experiência fora do meu corpo nesse momento”.

Renée gargalhou. “Ele te faz feliz, Bella?”

“Sim, mas...”

“Você vai querer outra pessoa algum dia?”

“Não, mas...”

“Mas o quê?”

“Mas você não vai dizer que eu pareço uma adolescente apaixonada como qualquer outra desde o início dos tempos?”

“Você nunca foi uma adolescente, queridinha. Você sabe o que é melhor pra você”.
Pelas últimas semanas, Renée mergulhou inadvertidamente em planos de casamento. Ela passava horas todos os dias no telefone com a mãe de Edward, Esme – não havia problemas em parentes se darem bem. Renée adorou Esme, mas também, eu duvidava que alguém pudesse reagir de outra forma á minha adorável quase sogra.
Isso me deixou por fora. A família de Edward e a minha estavam cuidando juntas das núpcias sem que eu tivesse que fazer nada ou saber e nem pensar demais nisso.
Charlie estava furioso, é claro, mas o lado bom era que ele não estava furioso comigo. A traidora era Renée. Ele estava contando com ela para ser tirana. O que ele podia fazer agora, quando a sua última ameaça — contar a mamãe — acabou dando em nada? Ele não tinha nada, e sabia disso. Então ele ficava vagando em casa, murmurando coisas sobre não se poder mais confiar em ninguém nesse mundo...
“Pai?” Eu chamei enquanto abria a porta da frente. “Estou em casa.”


“Espere, Bella, fique bem ai.”

“Huh?” Eu parei automaticamente.

“Me dê um segundo. Ouch, você conseguiu, Alice”.

Alice?

“Desculpa, Charlie”, a voz alegre de Alice respondeu. “Como está?”

“Eu estou sangrando”.

“Você está bem. A pele não foi ferida — confie em mim”.

“O que está acontecendo?” Eu quis saber, hesitando na entrada.

“Trinta segundos, por favor, Bella” Alice me disse. “Sua paciência será

recompensada”.

“Humph”, Charlie adicionou.

Eu bati o pé, contando cada batida. Antes de ir até a nossa sala de estar.

“Oh”, eu perdi o fôlego. “Aw, pai. Você está...”

“Boboca?” Charlie interrompeu.

“Eu estava pensando em algo mais parecido com elegante.”

Charlie ruborizou. Alice pegou o cotovelo dele e o rodou lentamente pra que ele mostrasse o terno cinza pálido.

“Pára com isso, Alice. Eu pareço um idiota.”

“Ninguém vestido por mim fica parecendo um idiota.”

“Ela está certa, pai. Você está fabuloso! Qual é a ocasião?”

Alice revirou os olhos. “É a última prova de roupa. Pra vocês dois.”

Eu tirei meus olhos da elegância não habitual de Charlie e pela primeira vez vi a bolsa branca estufada deitada cuidadosamente no sofá.

“Ahhh”.

“Vá para o seu cantinho feliz, Bella. Não vai demorar.”

Eu respirei fundo e fechei os olhos. Mantendo-os fechados, eu procurei o meu caminho subindo as escadas até o meu quarto. Eu fiquei de lingerie e estiquei os braços.

“Parece até que eu estou enfiando farpas de bambu embaixo das suas unhas.”

Alice murmurou pra si mesma enquanto me seguia. Eu não prestei atenção nela. Eu estava no meu cantinho feliz.





















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                              Sussurro - Becca Fitzpatrick
                      


Nora Grey é uma garota extremamente responsável e estudiosa, que sempre faz as coisas certas. Mantendo planos para conseguir entrar numa boa faculdade, Nora vê sua vida mudar drasticamente com a chegada de Patch, seu novo parceiro de biologia, extremamente atraente e misterioso, que parece saber mais sobre sua vida do que ela mesma. Impulsionada a descobrir mais sobre seu passado e sobre seu comportamento misterioso, Nora passa a investigar Patch, e a inevitavelmente se aproximar dele, sem saber que estaria colocando sua vida em risco. Mais tarde, Nora descobre que Patch é na verdade um anjo caído do céu por cobiçar a vida humana, e que aparentemente deseja matá-la para possuir seu corpo. No entanto, os dois acabam se apaixonando, o que coloca suas vidas em perigo já que um Nephilim (criatura feita a partir da relação de anjos caídos com seres humanos) deseja vingança com Patch.



Prólogo


Loire Valley1, França.


Novembro de 1565

Chauncey estava com a filha de um fazendeiro nos bancos relvados do rio Loire quando a tempestade começou, e tendo deixado seu cavalo castrado perambulando na clareira, foi deixado com seus dois próprios pés para levarem-no de volta ao château. Ele arrancou uma fivela prateada de seu sapato, a colocou na palma da mão da garota, e a observou sair correndo, lama afundando em sua saia. Então ele colocou suas botas e começou o caminho para casa.

Chuva envolveu o campo escuro que cercava o Château de Langeais. Chauncey pisou sem dificuldade nas sepulturas e humus submersos do cemitério; mesmo na espessa névoa ele conseguia encontrar seu caminho para casa daqui e não temia se perder. Não havia névoa nenhuma hoje a noite, mas a escuridão e o ataque da chuva eram enganadores o bastante.

Havia movimento na extremidade da visão de Chauncey, e ele virou instantaneamente sua cabeça para esquerda. Ao primeiro olhar, o que parecia ser um grande anjo no topo de um monumento próximo se levantou inteiramente. Nem pedra nem mármore, o garoto tinha braços e pernas. Seu torso estava nu, seus pés descalços, e uma calça de camponês pendia baixa em sua cintura. Ele pulou do monumento, as pontas de seu cabelo preto pingando da chuva. Ele escorregava no seu rosto, que era escuro como o de um espanhol.

A mão de Chauncey arrastou-se para o punho de sua espada. “Quem está aí?”

A boca do garoto deu um vestígio de sorriso.

“Não brinque com o Duc2 de Langeais,” Chauncey avisou. “Eu pedi o seu nome. Dê-o.”

“Duc?” O garoto se inclinou contra um salgueiro retorcido. “Ou bastardo?”

Chauncey desembainhou sua espada. “Retire o que disse! Meu pai era o Duc de Langeais. Eu sou o Duc de Langeais agora,” ele acrescentou desajeitadamente, e se amaldiçoou por isso.

1 O Vale de Loire, o rio mais longo da França. Também conhecido como Jardim da França e Berço da Lingua Francesa. Também é notável pela qualidade de sua herança arquitetural.

2 Do francês, duque.

O garoto deu um chacoalhar preguiçoso de sua cabeça. “Seu pai não era o antigo Duc.”

Chauncey ferveu com o afrontoso insulto. “E o seu pai?” ele exigiu, estendendo sua espada. Ele ainda não conhecia todos os seus vassalos, mas ele estava aprendendo. Ele marcaria o nome da família desse garoto a ferro na memória. “Eu perguntarei mais uma vez,” ele disse em uma voz baixa, esfregando uma mão pelo seu rosto para afastar a chuva. “Quem é você?”

O garoto andou e empurrou de lado a espada. Ele de repente parecia mais velho do que Chauncey havia presumido, talvez até mesmo um ou dois anos mais velho do que Chauncey. “Um dos descendentes do Diabo,” ele respondeu.

Chauncey sentiu um aperto de medo em seu estômago. “Você é um lunático delirante,” ele disse entre os dentes. “Caia fora do meu caminho.”

O chão abaixo de Chauncey se inclinou. Explosões de dourado e vermelho estouraram atrás de seus olhos. Encurvado com suas unhas triturando suas coxas, ele olhou para o garoto, pestanejando e arfando, tentando achar sentido no que acontecia. Sua mente vacilava como se não fosse mais sua para comandar.

O garoto se agachou para nivelar seus olhos. “Escute cuidadosamente. Eu preciso de algo de você. Eu não irei embora até eu ter isso. Você entende?”

Cerrando seus dentes, Chauncey balançou sua cabeça para expressar sua descrença – seu desacato. Ele tentou cuspir no garoto, mas escorreu em seu queixo, sua língua recusando-se a obedecê-lo.

O garoto entrelaçou suas mãos ao redor das de Chauncey; o calor delas o queimou e ele soltou um grito.

“Eu preciso do seu juramento de lealdade,” o garoto disse. “Ajoelhe-se sobre um joelho e jure.”

Chauncey ordenou sua garganta a rir cruelmente, mas sua garganta constringiu e ele se afogou com o som. Seu joelho direito entortou como se tivesse sido chutado por trás, apesar de ninguém estar lá, e ele tropeçou para a frente na lama. Ele se curvou de lado e forçou vômito sem sucesso.

“Jure,” o garoto repetiu.

Calor fluiu no pescoço de Chauncey; precisou de toda a sua energia para curvar suas mãos em dois punhos fracos. Ele riu de si mesmo, mas não havia humor. Ele não fazia ideia de como, mas o garoto estava inflingindo a náusea e a fraqueza dentro dele. Ela não seria suspensa até que ele prestasse o juramento. Ele diria o que tivesse que dizer, mas ele jurou em seu coração que destruiria o garoto por essa humilhação.

“Lorde, eu me torno seu homem,” Chauncey disse venenosamente.

O garoto levantou Chauncey de pé. “Me encontre aqui no começo do mês hebreu de Cheshvan3. Durante as duas semanas entre a lua nova e a cheia, eu precisarei de seu serviço.”

“Uma... quinzena?” Toda a estrutura de Chauncey tremeu debaixo do peso de sua raiva. “Eu sou o Duc de Langeais!”

“Você é um Nephil,” o garoto disse em uma fatia de sorriso.

Chauncey tinha uma réplica profana na ponta da língua, mas ele a engoliu. Suas próximas palavras foram ditas com gelado veneno. “O que você disse?”

“Você pertence a raça bíblica dos Nephilim4. Seu pai verdadeiro era um anjo que caiu do céu. Você é metade mortal.” Os olhos escuros do garoto se levantaram, encontrando os de Chauncey. “Metade anjo caído.”

A voz do tutor de Chauncey foi trazida dos recessos de sua mente, lendo passagens da Bíblia, contando de uma raça depravada criada quando anjos lançados do céu se acasalaram com mulheres mortais. Uma raça apavorante e poderosa. Um calafrio que não era repulsa total arrastou-se por Chauncey. “Quem é você?”

O garoto se virou, afastando-se, e embora Chauncey quisesse ir atrás dele, ele não conseguia ordenar suas pernas a suportar seu peso. Ajoelhado ali, pestanejando através da chuva, ele viu duas cicatrizes grossas nas costas do torso nu do garoto. Elas se estreitavam para formar um V de ponta-cabeça.

“Você é um – caído?” ele chamou. “Suas asas foram arrancadas, não foram?”

O garoto – anjo – quem quer que ele fosse, não se virou. Chauncey não precisou da confirmação.

“O serviço que eu vou prover,” ele gritou. “Eu exigo saber o que é!”

O ar ressoou com a baixa risada do garoto.

3 Abreviação de Marcheshvan. É o oitavo mês do calendário hebraico, e geralmente cai entre outubro/novembro no calendário gregoriano.

4 Do hebraico, ‘aqueles que caíram’ (anjos).
 
 
Capítulo 1
 
Coldwater, Maine


Dias atuais

Eu entrei na aula de biologia e meu queixo caiu. Misteriosamente aderido ao quadro-negro estava uma boneca Barbie, com Ken ao seu lado. Eles foram forçados a dar os braços e estavam nus, exceto por folhas artificiais colocadas em alguns lugares específicos. Rabiscado acima de suas cabeças em giz grosso rosa estava a convocação:

BEM VINDOS À REPRODUÇÃO HUMANA (SEXO)

Ao meu lado, Vee Sky disse, “É exatamente por isso que a escola proíbe câmeras de celular. Fotos disso no eZine seriam toda a evidência que eu precisaria para ir ao conselho da educação para remover biologia. E então teríamos essa hora para fazer algo produtivo – como receber monitoramento particular de veteranos gracinhas.”

“Ora, Vee,” eu disse, “Eu podia jurar que você estava esperando essa unidade o semestre todo.” Vee abaixou os cílios e sorriu maliciosamente. “Essa aula não vai me ensinar nada que eu já não saiba.”

“Vee? Tipo, virgem?”

“Não tão alto.” Ela piscou bem quando o sino tocou, mandando nós duas a nossos lugares, que eram lado a lado na nossa mesa compartilhada.

O Treinador McConaughy agarrou o apito balançando de uma corrente ao redor de seu pescoço e o assoprou. “Assentos, time!” O Treinador considerava ensinar biologia do segundo ano uma missão secundária de seu trabalho como treinador de basquete escolar, e todos sabíamos disso.

“Vocês podem não ter percebido que sexo é mais do que uma viagem de quinze minutos ao banco traseiro do carro. É ciência. E o que é ciência?”

“Uma chatice,” algum garoto no fundo da sala gritou.

“A única aula que eu estou reprovando,” disse outro.

Os olhos do Treinador examinaram a fileira da frente, parando em mim. “Nora?”

“O estudo de alguma coisa,” eu disse.

Ele andou até aqui e enfiou seu dedo indicador na mesa na minha frente. “O que mais?”

“Conhecimento ganho através de experimentos e observações.” Adorável. Eu soava como se estivesse fazendo um teste para um audiobook do nosso texto.

“Com suas próprias palavras.”

Eu toquei a ponta da minha língua com meu lábio superior e tentei um sinônimo. “Ciência é uma investigação.” Soava como uma pergunta.

“Ciência é uma investigação,” o Treinador disse, esfregando suas mãos juntas. “Ciência exigi que nós nos tranformemos em espiões.”

Colocado desse jeito, ciência quase soa divertido. Mas eu estivera na aula do Treinador tempo suficiente para não ter muitas esperanças.

“Uma boa investigação precisa de prática,” ele continuou.

“Assim como sexo,” veio outro comentário do fundo da sala. Todos nós engolimos a risada enquanto o Treinador apontava um dedo acusador para o transgressor.

“Isso não será parte da lição de casa de hoje a noite.” O Treinador virou sua atenção de volta a mim. “Nora, você está se sentando ao lado da Vee desde o começo do ano.” Eu assenti, mas tinha um mau pressentimento sobre onde isso estava chegando. “Ambas estão no eZine da escola juntas.” Novamente eu assenti. “Aposto que conhecem bastante uma sobre a outra.”

Vee chutou minha perna debaixo da nossa mesa. Eu sabia o que ela estava pensando. Que ele não fazia ideia do quanto conhecíamos uma sobre a outra. E eu não quero só dizer os segredos que enterramos em nossos diários. Vee é minha des-gêmea. Ela tem olhos verdes, cabelos loiro-marta5, e alguns quilos acima de curvilínea. Eu sou uma morena de olhos esfumaçados com um volume de cabelo encaracolado que se mantém firme até mesmo contra a melhor chapinha. E sou só pernas, como um banquinho de bar. Mas há uma corda invisível que nos une; ambas juramos que esse laço começou bem antes do nascimento. Ambas juramos que continuará seguro pelo resto das nossas vidas.

O Treinador deu uma olhada na sala. “De fato, eu aposto que cada um de vocês conhece a pessoa sentando ao lado de você bem o bastante. Vocês escolheram os assentos que escolheram por uma razão, certo? Familiaridade. Que pena que os melhores detetives evitam familiaridade. Ela entorpece o instinto investigativo. E é por isso que, hoje, vamos criar um novo mapa de assentos.”

5 Marta é a denominação comum dado aos mamíferos mustelídeos do gênero Martes. Esses animais têm uma pele muito apreciada.

Eu abri minha boca para protestar, mas Vee chegou antes. “Mas que porcaria? É abril. Tipo, quase o final do ano6. Você não pode mexer nesse tipo de negócio agora.”

O Treinador deu um vestígio de sorriso. “Eu posso mexer nesse negócio até o último dia do semestre. E se você reprovar na minha aula, você estará de volta aqui no ano que vem, onde eu estarei mexendo nesse tipo de negócio novamente.”

Vee fez uma carranca para ele. Ela é famosa por aquela carranca. É um olhar que faz tudo, exceto sibilar audivelmente. Aparentemente imune a ele, o Treinador trouxe seu apito aos lábios, e captamos a ideia.

“Cada parceiro sentado no lado esquerdo da mesa – a esquerda de vocês – mova-se um assento para frente. Aqueles na fileira da frente – sim, incluindo você, Vee – movam-se para os fundos.”

Vee enfiou seu caderno dentro de sua mochila e arrebentou o zíper ao fechar. Eu mordi meu lábio e acenei um pequeno adeus. Então eu me virei ligeiramente, checando a sala atrás de mim. Eu conhecia os nomes de todos os meus colegas de sala... exceto um. O transferido. O Treinador nunca o chamou, e ele parecia preferir desse jeito. Ele se sentava desleixadamente uma mesa atrás, gelados olhos negros encarando à frente firmemente. Exatamente como sempre. Eu nem por um momento acreditava que ele simplesmente sentava lá, dia após dia, encarando o vazio. Ele estava pensando algo, mas o instinto me dizia que eu provavelmente não queria saber o que.

Ele assentou seu livro de biologia na mesa e deslizou na antiga cadeira da Vee.

Eu sorri. “Oi. Eu sou a Nora.”

Seus olhos negros me cortaram, e os cantos de sua boca inclinaram-se para cima. Meu coração errou uma batida e naquela pausa, um sentimento de triste escuridão pareceu deslizar como uma sombra sobre mim. Ele sumiu em um instante, mas eu ainda estava encarando-o. Seu sorriso não era amigável. Era um sorriso que soletrava encrenca. Como uma promessa.

Eu me foquei no quadro negro. A Barbie e o Ken encararam de volta com sorrisos estranhamente alegres.

O Treinador disse, “Reprodução humana pode ser um assunto pegajoso –”

“Uiii!” resmungou um coro de estudantes.

“É preciso um manuseamento maduro. E como toda ciência, a melhor abordagem é aprender a investigar. Pelo resto da aula, pratiquem essa técnica descobrindo o quanto puderem sobre seu novo parceiro. Amanhã, tragam em

6 Nos EUA, o final do ano letivo é em junho/julho.

escrito suas descobertas, e acreditem em mim, eu vou checar a autenticidade. Isso é biologia, não inglês, então nem pensem em ficcionalizar suas respostas. Eu quero ver interação e trabalho em equipe reais.” Havia um Ou então implícito.

Eu me sentei perfeitamente imóvel. A bola estava no campo dele – eu tinha sorrido, e olha como isso ajudou. Eu enruguei meu nariz, tentando descobrir a que ele cheirava. Não a cigarros. Algo mais profundo, mais asqueroso.

Charutos.

Eu encontrei o relógio na parede e bati meu lápis na hora da segunda mão. Eu plantei meu cotovelo na mesa e apoiei meu queixo no meu punho. Eu soprei um suspiro.

Ótimo. A esse ponto eu iria falhar.

Eu estava com meus olhos fixos a frente, mas eu ouvi o suave deslizar de sua caneta. Ele estava escrevendo, e eu queria saber o que. Dez minutos sentados juntos não o qualificava para fazer qualquer suposição sobre mim. Movendo um olhar lateral, eu vi que seu papel tinha várias linhas escritas e estava crescendo.

“O que você está escrevendo?” eu perguntei.

“E ela fala inglês,” ele disse enquanto rabiscava, cada pincelada de sua mão suave e preguiçosa ao mesmo tempo.

Eu me inclinei o mais perto dele que eu ousava, tentando ler o que mais ele tinha escrito, mas ele dobrou o papel ao meio, escondendo a lista.

“O que você escreveu?” Eu exigi.

Ele esticou a mão para o meu papel não-usado, deslizando-o pela mesa na direção dele. Ele o amassou em uma bola. Antes que eu pudesse protestar, ele o jogou numa lata de lixo ao lado da mesa do Treinador. O arremesso caiu dentro.

Eu encarei a lata de lixo por um momento, presa entre a descrença e a raiva. Então eu abri meu caderno em uma página em branco. “Qual é o seu nome?” Eu perguntei, o lápis pronto para escrever.

Eu olhei para cima a tempo de captar outro sorriso sombrio. Esse parecia me desafiar a arrancar qualquer coisa dele.

“Seu nome?” Eu repeti, esperando que fosse minha imaginação minha voz ter vacilado.

“Me chama de Patch. Sério. Me chama.”

Ele piscou quando disse isso, e eu estava bem certa de que ele estava me zoando. “O que você faz nas suas horas de ócio?” eu perguntei.

“Eu não tenho tempo livre.”

“Presumo que essa tarefa vale nota, então me faz um favor?”

Ele se reclinou em seu assento, dobrando seus braços atrás de sua cabeça. “Que tipo de favor?”

Eu tinha bastante certeza de que isso uma indireta, e eu lutei por um jeito de mudar de assunto.

“Tempo livre,” ele repetiu pensativamente. “Eu tiro fotos.”

Eu copiei Fotografia no meu papel.

“Eu não terminei,” ele disse. “Eu tenho uma bela coleção de uma colunista de eZine que acredita que há verdade em comer organicamente, que escreve poesia em segredo, e que estremece ao pensar em ter que escolher entre Stanford, Yale, e... qual é aquela grandona com H?”

Eu o encarei por um momento, balançada por ele ter acertado na mosca. Eu não tinha o pressentimento de que era um chute. Ele sabia. E eu queria saber como – agora.

“Mas você não acabará indo para nenhuma delas.”

“Eu não irei?” Eu perguntei sem pensar.

Ele prendeu seus dedos debaixo do assento da minha cadeira, me arrastando para mais perto dele. Não certa se deveria escapar e mostrar medo, ou fazer nada e fingir tédio, eu escolhi o último.

Ele disse, “Embora você prosperasse nas três escolas, você as desdenha por serem um cliché em realização. Julgar é sua terceira maior fraqueza.”

“E minha segunda?” Eu disse com bastante raiva. Quem era esse cara? Essa era algum tipo de piada perturbadora?

“Você não sabe como confiar. Eu retiro o que disse. Você confia – só que nas pessoas erradas.”

“E o meu primeiro?” Eu exigi.

“Você mantém a vida numa coleira curta.”

“O que isso quer dizer?”

“Você tem medo do que não consegue controlar.”

O cabelo na minha nuca ficou de pé, e a temperatura na sala pareceu esfriar. Normalmente eu teria ido diretamente para a mesa do Treinador e pedido um novo mapa de assentos. Mas eu me recusava a deixar Patch pensar que ele podia me intimidar ou assustar. Eu senti uma necessidade irracional de me defender e decidi bem ali e agora que eu não recuaria até que ele recuasse.

“Você dorme pelada?” ele perguntou.

Minha boca ameaçou cair, mas eu a segurei no lugar. “Você está longe de ser a pessoa a quem eu contaria.”

“Já foi a um psiquiatra?”

“Não,” eu menti. A verdade era que eu tinha consulta com o psicólogo da escola, Dr. Hendrickson. Não era por escolha, e não era algo que eu gostasse de falar sobre.

“Fez algo ilegal?”

“Não.” Ocasionalmente passar do limite de velocidade não contaria. Não com ele. “Por que você não me pergunta algo normal? Como... meu tipo favorito de música?”

“Eu não vou perguntar o que eu posso adivinhar.”

“Você não sabe o tipo de música que eu escuto.”

“Barroco. Com você, tudo é ordem, controle. Eu aposto que você toca... violoncelo?” Ele disse isso como se tivesse chutado do nada.

“Errado.” Outra mentira, mas essa enviou um arrepio pela minha pele que deixou meus dedos formigando. Quem era ele, realmente? Se ele sabia que eu tocava violoncelo, o que mais ele sabia?

“O que é isso?” Patch deu um tapinha com sua caneta no interior do meu pulso. Instintivamente eu recuei.

“Uma marca de nascença.”

“Parece uma cicatriz. Você é suicida, Nora?” Seus olhos se conectaram com os meus, e eu pude sentir ele rindo. “Pais casados ou divorciados?”

“Eu moro com a minha mãe.”

“Onde está o pai?”

“Meu pai morreu ano passado.”

“Como ele morreu?”

Eu hesitei. “Ele foi – assassinado. Esse é um território meio pessoal, se não se importa.”

Houve uma contagem de silêncio e a beirada dos olhos de Patch pareceu suavizar um pouco. “Isso deve ser duro.” Ele soava sério.

O sino tocou e Patch estava de pé, caminhando em direção a porta.

“Espera,” eu chamei. Ele não se virou. “Com licença!” Ele tinha passado pela porta. “Patch! Eu não peguei nada sobre você.”

Ele se virou e andou na minha direção. Tomando minha mão, ele rabiscou algo nela antes de eu a puxar.

Eu olhei para baixo para os sete números em tinta vermelha na minha palma e fechei a mão ao redor deles. Eu queria dizer a ele que de jeito nenhum seu telefone tocaria hoje a noite. Eu queria dizer a ele que era culpa dele por tomar todo o tempo me questionando. Eu queria um monte de coisas, mas eu só fiquei parada lá parecendo como se não soubesse abrir minha boca.

Por fim eu disse, “Estou ocupada hoje a noite.”

“Assim como eu.” Ele sorriu e se foi.

Eu fiquei pregada no lugar, digerindo o que tinha acabado de acontecer. Ele tinha comido todo o tempo me questionando de propósito? Para que eu falhasse? Ele achava que um relampejo de sorriso o redimiria? Sim, eu pensei. Sim, ele achava.

“Eu não vou ligar!” Eu gritei depois dele. “Não – nunca!”

“Você terminou a sua coluna para o prazo de amanhã?” Era a Vee. Ele apareceu ao meu lado, anotando no caderno que ela carregava para todo lugar. “Estou pensando em escrever a minha sobre a injustiça do mapa de assentos. Eu fiquei com uma garota que disse que tinha acabado um tratamento para piolho essa manhã.”

“Meu novo parceiro,” eu disse, apontando no corredor para as costas de Patch. Ele tinha um andar irritantemente confiante, do tipo que você acha combinado com camisetas desbotadas e um chapéu de caubói. Patch não usava nenhum dos dois. Ele era um garoto do tipo Levi’s-escura-jaqueta-escura-botas-escuras.

“O veterano transferido? Acho que ele não estudou o bastante da primeira vez. Ou da segunda.” Ela me deu um olhar astucioso. “Na terceira ele tem sorte.”

“Ele me dá arrepios. Ele conhecia a minha música. Sem qualquer dica, ele disse, ‘Barroco’.” Eu fiz uma péssima imitação de sua voz baixa.

“Chute de sorte?”

“Ele sabia.... outras coisas.”

“Como o quê?”

Eu soltei um suspiro. Ele sabia mais do que eu queria contemplar confortavelmente. “Tipo como me enlouquecer,” eu disse por fim. “Eu vou dizer ao Treinador que ele tem que nos trocar de volta.”

“Vai nessa. Eu podia ter um gancho para o meu próximo artigo no eZine. ‘Segunda-anista Defende-se.’ Melhor ainda, ‘Mapa de Assento Leva um Tapa na Cara.’ Hmm. Eu gostei.”

No final do dia, fui eu quem levou um tapa na cara. O Treinador recusou meu pedido para repensar o mapa de assentos. Parecia que eu estava presa com o Patch.
Por ora.

          
                            Capítulo 2


MINHA MÃE E EU VIVÍAMOS EM UMA FRIA casa de fazenda do século dezoito no limite de Coldwater. É a única casa na Alameda Hawthorne, e os vizinhos mais próximos estão há quase 1,6 quilômetros de distância. Às vezes me pergunto se o construtor original percebeu que de todos os pedaços de terra disponíveis, ele decidiu construir a casa no olho de uma misteriosa inversão atmosférica que parece sugar toda a névoa da costa do Maine e transplantá-la no nosso jardim. A casa estava nesse momento velada por uma melancolia que lembrava espíritos que escaparam e estão vagando.


Eu passei a noite plantada em um banquinho de bar na cozinha na companhia da lição de álgebra e Dorothea, nossa governanta. Minha mãe trabalha para a Empresa de Leião Hugo Renaldi, coordenando leilões imobiliários e de antiguidades em toda a costa oeste. Essa semana ela estava em Charleston, Carolina do Sul. Seu trabalho requeria muitas viagens, e ela pagava Dorothea para cozinhar e limpar, mas eu estava bem certa de que as letras miúdas da descrição do trabalho da Dorothea incluíam manter um olho observador e parental em mim.

“Como foi a escola?” Dorothea perguntou com um ligeiro sotaque alemão. Ela estava de pé na cozinha, esfregando lasanha cozida demais de uma caçarola.

“Tenho um novo parceiro de biologia.”

“Isso é uma coisa boa, ou uma coisa ruim?”

“Vee era a minha antiga parceira.”

“Humph.” Mais esfregação vigorosa, e a carne na parte superior do braço de Dorothea sacolejou. “Uma coisa ruim, então.”

Eu suspirei em concordância.

“Me conte sobre a sua nova parceira. Essa garota, como ela é?”

“Ele é alto, moreno, e irritante.” E misteriosamente fechado. Os olhos de Patch eram órbitas negras. Retendo tudo e retornando nada. Não que eu quisesse saber mais sobre o Patch. Já que eu não tinha gostado do que eu tinha visto na superfície, eu duvidava de que eu gostaria do que estivesse espreitando lá no fundo.

Só que, isso não era exatamente verdade. Eu tinha gostado muito do que eu tinha visto. Músculos longos e magros em seus braços, ombros largos, mas relaxados, e um sorriso que era parcialmente brincalhão, parcialmente sedutor.

Eu estava em uma aliança incômoda comigo mesma, tentando ignorar o que começara a parecer irresistível.

Às nove horas, Dorothea terminou o jantar e trancou a casa ao sair. Como forma de adeus, eu pisquei as luzes da varanda duas vezes; elas devem deve ter penetrado a névoa, porque ela respondeu com uma buzina. Eu estava sozinha.

Eu fiz um inventário dos sentimentos brincando dentro de mim. Eu não estava com fome. Eu não estava cansada. Eu não estava nem mesmo tão solitária. Mas eu estava um pouco inquieta sobre a minha tarefa de biologia. Eu tinha dito ao Patch que eu não ligaria, e seis horas atrás eu tinha falado sério. Tudo em que eu podia pensar agora era que eu não queria falhar. Biologia era a minha matéria mais difícil. Minha nota oscilava problematicamente entre 9 e 8. Na minha mente, essa era a diferença entre uma bolsa de estudos integral e parcial no meu futuro.

Eu fui para a cozinha e peguei o telefone. Eu olhei para o que tinha sobrado dos sete números ainda tatuados na minha mão. Secretamente, eu esperava que o Patch não atendesse a minha ligação. Se ele não estivesse disponível ou cooperasse nas tarefas, era uma evidência que eu podia usar contra ele para convencer o Treinador a desfazer o mapa de assentos. Sentindo-me esperançosa, eu digitei seu número.

Patch respondeu no terceiro toque. “E aí?”

Em um tom prosaico, eu disse, “Estou ligando para ver se podemos nos encontrar hoje à noite. Eu sei que você disse que está ocupado, mas –”

“Nora.” Patch disse meu nome como se fosse a parte final de uma piada. “Achei que você não fosse ligar. Nunca.”

Eu odiava estar comendo as minhas palavras. Eu odiava o Patch por estar esfregando-as. Eu odiava o Treinador por suas tarefas enlouquecedoras. Eu abri minha boca, esperando que algo inteligente saísse. “Bem, podemos nos encontrar ou não?”

“Acontece que eu não posso.”

“Não pode ou não vai?”

“Estou no meio de um jogo de sinuca.” Eu ouvi o sorriso em sua voz. “Um jogo de sinuca importante.”

Pelo barulho de fundo que eu ouvi em sua linha, eu acreditava que ele estava dizendo a verdade – sobre o jogo de sinuca. Se isso era mais importante que a minha tarefa de biologia, era debatível.

“Onde você está?” eu perguntei.

“Bo's Arcade. Não é o seu tipo de lugar.”

“Então vamos fazer a entrevista no telefone. Eu tenho uma lista de perguntas bem –”

Ele desligou na minha cara.

Eu encarei o telefone em descrença, então arranquei uma folha de papel em branco do meu caderno. Eu rabisquei Babaca na primeira linha. Na linha abaixo dessa eu acrescentei Fuma charutos. Vai morrer de câncer de pulmão. Com sorte logo. Excelente forma física.

Eu imediatamente risquei a última observação até que ficasse ilegível.

O relógio do micro-ondas piscava 21:05. Da minha perspectiva, eu tinha duas escolhas. Ou eu inventava minha entrevista com o Patch, ou eu dirigia até a Bo's Arcade. A primeira opção podia ter sido tentadora, se ao menos pudesse bloquear a voz do Treinador alertando que ele checaria todas as respostas para autenticidade. Eu não conhecia o suficiente sobre Patch para blefar a entrevista inteira. E a segunda opção? Nem mesmo remotamente tentadora.

Eu atrasei tomar uma decisão tempo o bastante para ligar para minha mãe. Parte do nosso acordo para ela trabalhar e viajar tanto era que eu agisse responsavelmente e não fosse o tipo de filha que requisitasse supervisão constante. Eu gostava da minha liberdade, e eu não queria fazer nada para dar à minha mãe uma razão para cortar seu salário e pegar um trabalho local para ficar de olho em mim.

No quarto toque, seu correio de voz atendeu.

“Sou eu,” eu disse. “Só estou checando. Tenho lição de biologia para terminar, depois eu vou para a cama. Me ligue no almoço, se você quiser. Te amo.”

Depois de desligar, eu achei uma moeda de 25 centavos na gaveta da cozinha. É melhor deixar decisões complicadas para o destino.

“Cara eu vou,” eu disse ao perfil de George Washington. “Coroa eu fico.” Eu joguei a moeda de 25 centavos no ar, achatei-a nas costas da minha palma, e ousei dar uma espiada. Meu coração espremeu uma batida extra, e eu disse a mim mesma que eu não tinha certeza o que isso significava.

“Não está mais nas minhas mãos agora,” eu disse.

Determinada a acabar com isso o mais rápido possível, eu agarrei um mapa da geladeira, apanhei minhas chaves, e recuei meu Fiat Spider pela estrada. O carro provavelmente fora fofo em 1979, mas eu não era louca pela pintura marrom chocolate, pela ferrugem se espelhando desenfreada pelo para-choque traseiro, ou pelos assentos arrebentados de couro branco.

A Bo's Arcade acabou sendo mais longe do que eu teria gostado, aninhada perto à costa, uma viagem de trinta minutos. Com o mapa esticado no volante,

eu parei o Fiat em um estacionamento atrás de um amplo prédio de blocos cinzas com uma placa elétrica piscando BO'S ARCADE, MAD BLACK PAINTBALL & OZZ’S POOL HALL. Grafite salpicava as paredes, e butucas de cigarro pontuavam a calçada. Claramente o Bo's estaria cheio de futuros estudantes da Ivy League7 e cidadãos modelo. Eu tentei manter meus pensamentos altivos e indiferentes, mas meu estômago estava um pouco inquieto. Checando novamente se eu tinha trancado todas as portas, eu me dirigi para dentro.

Eu fiquei na fila, esperando passar pelas cordas. Enquanto o grupo à minha frente pagava, eu passei me espremendo, andando na direção do labirinto de sirenes estrondeantes e das luzes piscantes.

“Acha que merece um passe grátis?” gritou uma voz rouca de fumaça.

Eu me virei e pestanejei para o caixa excepcionalmente tatuado. Eu disse, “Não estou aqui para brincar. Estou procurando por alguém.”

Ele resmungou. “Se quiser passar por mim, tem que pagar.” Ele colocou suas palmas sobre o balcão, onde uma tabela de preços tinha sido colada com durex, mostrando que eu devia quinze dólares. Somente dinheiro.

Eu não tinha dinheiro. E se eu tivesse, eu não teria desperdiçado-o gastando uns poucos minutos interrogando o Patch sobre sua vida pessoal. Eu senti um fluxo de raiva pelo mapa de assentos e por ter que estar aqui em primeiro lugar. Eu só precisava achar o Patch, então poderíamos assegurar a entrevista do lado de fora. Eu não tinha dirigido até aqui para ir embora de mãos vazias.

“Se eu não voltar em dois minutos, eu pago os quinze dólares,” eu disse. Antes que eu pudesse exercitar um melhor julgamento ou reunir um rico mais de coragem, eu fiz algo totalmente fora do normal e me abaixei por debaixo das cordas. Eu não parei lá. Eu me apressei pela arcada, mantendo meus olhos abertos pelo Patch. Eu disse a mim mesma que não conseguia acreditar que estava fazendo isso, mas eu era como uma bola de neve rolante, ganhando velocidade e ímpeto. Nesse momento eu só queria achar o Patch e cair fora.

O caixa me seguiu, gritando, “Ei!”

Certa de que o Patch não estava no nível principal, eu corri escada abaixo, seguindo placas para o Ozz’ Pool Hall. Ao fim da escada, uma trilha de iluminação turva iluminava diversas mesas de pôquer, todas em uso. Fumaça de charuto quase tão grossa quanto à névoa envolvendo a minha casa escurecia o teto baixo. Aninhada entre as mesas de pôquer e o bar estava uma fileira de

7 Grupo de oito universidades privadas do Nordeste dos Estados Unidos da América. O grupo é constituído pelas instituições de maior prestígio científico nos Estados Unidos e no mundo e, assim, atualmente a denominação tem conotação sobretudo de excelência acadêmica.

mesas de sinuca. Patch estava esticado na que ficava transversalmente a mim, tentando uma difícil tacada de mestre.

“Patch!” eu chamei.

Bem quando eu falei, ele atirou seu taco de sinuca, impulsionando-o no topo da mesa. Sua cabeça levantou-se rapidamente. Ele me encarou com uma mistura de surpresa e curiosidade.

O caixa claudicou os passos atrás de mim, mirando no meu ombro com sua mão. “Para cima. Agora.”

A boca de Patch se deslocou em outro quase sorriso. Difícil dizer se era zombador ou amigável. “Ela está comigo.”

Isso pareceu ter alguma influência com o caixa, que relaxou seu aperto. Antes que ele pudesse mudar de ideia, eu retirei sua mão e contorci-me entre as mesas na direção de Patch. Eu andei os primeiros diversos passos a passos largos, mas descobri minha confiança escorregando quando mais perto eu chegava dele.

Eu fiquei imediatamente consciente de algo diferente nele. Eu não conseguia exatamente afirmar o que, mas eu podia sentir isso como eletricidade. Mais animosidade?

Mais confiança.

Mais liberdade de ser ele mesmo. E aqueles olhos negros estavam me incomodando. Eles eram como imãs, unindo-se a cada movimento meu. Eu engoli em seco discretamente e tentei ignorar o enjoativo sapateado no meu estômago. Eu não conseguia exatamente afirmar o que, mas algo em Patch não era correto. Algo nele não era normal. Algo não era... seguro.

“Desculpe por ter desligado,” Patch disse, vindo ao meu lado. “A recepção não é boa aqui embaixo.”

É, tá bom.

Com uma inclinação de sua cabeça, Patch gesticulou para que os outros fossem embora. Houve um silêncio inquietante antes que qualquer um se movesse. O primeiro cara a sair bateu no meu ombro enquanto passava. Eu dei um passo para trás para me equilibrar e olhei para cima bem em tempo de receber olhares frios de outros dois jogadores enquanto eles partiam.

Ótimo. Não era minha culpa que Patch era meu parceiro.

“Bola oito8?” Eu perguntei a ele, levantando minhas sobrancelhas e tentando soar completamente certa de mim mesma, dos meus arredores.

8 Jogo de bilhar americano que se disputa com as bolas da 1 a 15. Se ganha embolsando a bola 8 (negra), depois de ter encaçapado o grupo de bolas que corresponde a cada jogador, o da 1 a 7 ou da 10 a 15. Deve-se anunciar a bola que se introduzirá em cada tacada e a bolsa em que se fará.

Talvez ele estivesse certo e o Bo’s não fosse o meu tipo de lugar. Isso não queria dizer que eu ia correr em direção às portas. “Em quanto estão às apostas?”

Seu sorriso se alargou. Dessa vez eu estava bem certa de que ele estava zombando de mim. “Nós não jogamos por dinheiro.”

Eu coloquei minha bolsa de mão na ponta da mesa. “Que pena. Eu ia apostar tudo que eu tenho contra você.” Eu levantei minha tarefa, duas linhas já preenchidas. “Algumas rápidas perguntas e estou fora daqui.”

“Babaca?” Patch leu em voz alta, inclinando-se sobre seu taco de sinuca. “Câncer de pulmão? É pra isso ser profético?”

Eu ventilei a tarefa pelo ar. “Assumo que você contribuiu para a atmosfera. Quantos charutos por noite? Um? Dois?”

“Eu não fumo.” Ele soava sincero, mas eu não engolia.

“Mm-hmm,” eu disse, deixando o papel de lado entre a bola oito e a roxa sólida. Eu acidentalmente acotovelei a roxa sólida enquanto escrevia Charutos, definitivamente na linha três.

“Você está bagunçando o jogo,” Patch disse, ainda sorrindo.

Eu captei seu olhar e não pude evitar igualar seu sorriso – brevemente. “Com sorte não em seu favor. Maior sonho?” Eu estava orgulhosa dessa porque sabia que iria aturdi-lo. Ela requeria premeditação.

“Beijar você.”

“Isso não é engraçado,” eu disse, segurando seus olhos, grata por não ter gaguejado.

“Não, mas fez você corar.”

Eu me empurrei para o lado da mesa, tentando parecer apática enquanto fazia isso. Eu cruzei minhas pernas, usando meu joelho como uma tábua para escrever. “Você trabalha?”

“Eu sirvo mesas no Borderline. O melhor restaurante mexicano da cidade.”

“Religião?”

Ele não pareceu surpreso pela pergunta, mas ele não pareceu radiante com ela tampouco. “Eu pensei que você tivesse dito algumas rápidas perguntas. Você já está na número quatro.”

“Religião?” eu perguntei mais firmemente.

Patch arrastou uma mão pensativamente pela linha de sua mandíbula. “Religião não... culto.”

“Você pertence a um culto?” Eu percebi tarde demais que, embora eu soasse surpresa, eu não deveria ter.

“Acontece que eu estou precisando de um sacrifício feminino saudável. Eu planejava seduzi-la para que confiasse em mim primeiro, mas se você está pronta agora...”

Qualquer sorriso restante no meu rosto desapareceu. “Você não está me impressionando.”

“Eu não comecei a tentar ainda.”

Eu me debrucei da mesa e fiquei de pé encarando-o. Ele era uma cabeça inteira mais alto. “Vee me disse que você é um veterano. Quantas vezes você reprovou em biologia do segundo ano? Uma vez? Duas vezes?”

“Vee não é minha porta-voz.”

“Está negando ter reprovado?”

“Estou te dizendo que eu não fui para a escola ano passado.” Seus olhos me zombaram... Isso só me deixou mais determinada.

“Você é uma cabulador?”

Patch deitou seu taco de sinuca no topo da mesa e curvou um dedo para mim chegar mais perto. Eu não cheguei. “Um segredo?” ele disse em tons confidenciais. “Eu nunca fui pra escola antes. Outro segredo? Não é tão chato quando eu esperava.”

Ele estava mentindo. Todos iam para a escola. Havia leis. Ele estava mentindo para tirar alguma resposta de mim.

“Você acha que eu estou mentindo,” ele disse em volta de um sorriso.

“Você nunca foi para a escola, nunca? Se isso for verdade – e você está certo, eu não acho que seja – o que fez você decidir vir esse ano?”

“Você.”

O impulso de me sentir assustada golpeou-me, mas eu disse a mim mesma que era exatamente isso que Patch queria. Marcando meu território, eu tentei agir irritada, ao invés. Ainda assim, levei um momento para achar minha voz. “Essa não é uma resposta de verdade.”

Ele deve ter dado um passo para mais perto, porque de repente nossos corpos estavam separados por nada mais do que uma superficial margem de ar. “Seus olhos, Nora. Esses olhos cinzas frios e pálidos são surpreendentemente irresistíveis.” Ele curvou sua cabeça de lado, como se para me estudar de um novo ângulo. “E essa boca curvilínea assassina.”

Espantada não tanto pelo comentário dele, mas pela parte de mim que respondeu positivamente a ele, eu recuei. “Já chega. Vou cair fora daqui.”

Mas assim que as palavras saíram da minha boca, eu sabia que elas não eram verdadeiras. Eu senti o desejo de dizer algo mais. Selecionando os pensamentos emaranhados na minha cabeça, eu tentei achar o que era que eu

sentia que devia dizer. Por que ele era tão irrisório, e por que ele agia como se eu tivesse feito algo para merecer isso?

“Você parece saber muito sobre mim,” eu disse, fazendo a atenuação do ano. “Mais do que você deveria. Você parece saber exatamente o que dizer para me deixar desconfortável.”

“Você facilita.”

Uma faísca de raiva disparou por mim. “Você admite que está fazendo isso de propósito?”

“Isso?”

“Isso – me provocando.”

“Diga ‘provocando’ novamente. Sua boca fica provocativa quando você faz isso.”

“Acabamos aqui. Termine seu jogo de sinuca.” Eu agarrei seu taco de sinuca da mesa e empurrei para ele. Ele não pegou-o.

“Eu não gosto de sentar do seu lado,” eu disse. “Eu não gosto de ser sua parceira. Eu não gosto do seu sorriso condescente.” Minha mandíbula tremeu – algo que tipicamente acontecia quando eu mentia. Eu me perguntei se eu estava mentindo agora. Se eu estivesse, eu queria me chutar. “Eu não gosto de você,” eu disse o mais convincentemente que consegui, e enfiei o taco contra seu peito.

“Estou feliz pelo Treinador nos ter colocado juntos,” ele disse. Eu detectei uma leve ironia na palavra “Treinador”, mas eu não consegui descobrir nenhum significado escondido. Dessa vez ele pegou o taco de sinuca.

“Estou trabalhando para mudar isso,” eu reagi.

Patch achou que isso era tão engraçado que seus dentes apareceram em seu sorriso. Ele se esticou até mim, e antes que eu pudesse me afastar, ele desembaraçou algo do meu cabelo.

“Pedaço de papel,” ele explicou, jogando-o no chão. Enquanto ele esticava sua mão, eu notei uma marca na parte interna do seu pulso. De primeira eu presumi que fosse uma tatuagem, mas um segundo olhar revelou um marrom rubicundo, uma marca de nascença ligeiramente levantada. Era da forma de um pingo de tinta esparramado.

“Que lugar infeliz para uma marca de nascença,” eu disse, mais do que um pouco enervada por estar tão similarmente posicionada à minha própria cicatriz.

Patch casual e notavelmente deslizou sua manga sobre seu pulso. “Você preferiria em algum lugar mais privado?”

“Eu não a preferiria em qualquer outro lugar.” Eu não estava certa de como isso soava e tentei novamente. “Eu não ligaria se você nem ao menos a tivesse.” Eu tentei uma terceira vez. “Eu não ligo para a sua marca de nascença, ponto.”

“Mais perguntas?” ele perguntou. “Comentários?”

“Não.”

“Então te vejo na aula de biologia.”

Eu pensei em dizer a ele que ele nunca me veria novamente. Mas eu não ia comer minhas palavras duas vezes em um dia.

Mais tarde naquela noite um crack! me puxou do sono. Com meu rosto esmagado contra meu travesseiro, eu fiquei imóvel, todos os meus sentidos em alerta total. Minha mãe ficava fora da cidade pelo menos uma vez por mês por causa do trabalho, então eu estava acostumada a dormir sozinha, e fazia meses desde que eu tinha imaginado o som de passos rastejando pelo corredor na direção do meu quarto. A verdade era que eu nunca me sentia completamente sozinha. Logo depois do meu pai ter sido atirado até a morte em Portland enquanto comprava um presente de aniversário para a minha mãe, uma presença estranha entrou na minha vida. Como se alguém estivesse orbitando meu mundo, observando de longe. De primeira a presença fantasmagórica tinha me apavorado, mas quando nada de ruim sucedeu disso, minha ansiedade perdeu sua animação. Eu comecei a me perguntar se havia um propósito cósmico para a maneira como eu estava me sentindo. Talvez o espírito do meu pai estivesse por perto. O pensamento era geralmente confortante, mas hoje a noite era diferente. A presença parecia gelo na pele.

Virando a minha cabeça uma fração, eu vi uma forma sombreada se esticando pelo meu chão. Eu girei para ver um rosto na janela, o raio de luz transparente do luar a única luz no quarto capaz de jogar sombras. Mas nada estava lá. Eu apertei meu travesseiro contra mim e disse a mim mesma que era uma nuvem passando sobre a lua. Ou um pedaço de lixo soprando no vento. Ainda assim, eu passei os próximos minutos esperando minha pulsação se acalmar.

Na hora que eu reuni coragem para sair da cama, o jardim abaixo da minha janela estava silencioso e imóvel. O único barulho vinha dos gravetos de árvore arranhando a casa, e do meu próprio coração batendo debaixo da minha pele.


                                                    Capítulo 3

O TREINADOR MCCONAUGHTY FICOU DE PÉ NO QUADRO-NEGRO falando com monotonia sem parar sobre algo, mas a minha mente estava distante das complexidades da ciência.


Eu estava ocupada formulando razões para o porque Patch e eu não deveríamos mais ser parceiros, fazendo uma lista delas atrás de um teste velho. Assim que a aula acabasse, eu apresentaria meus argumentos para o Treinador. Não coopera em tarefas, eu escrevi. Mostra pouco interesse em trabalhos de equipe.

Mas eram as coisas que não estavam listadas que me incomodavam. Eu achava a localização da marca de nascença de Patch estranha, e eu fiquei assustada com o acidente na minha janela na noite passada. Eu não suspeitei de imediato de Patch me espionando, mas eu não conseguia ignorar a coincidência de que eu tinha quase certeza de ter visto alguém olhando na minha janela só horas depois de tê-lo conhecido.

Ao pensar em Patch me espionando, eu alcancei o compartimento dianteiro da minha mochila e chacoalhei duas pílulas de ferro de uma garrafa, engolindo-as inteiro. Elas prenderam na minha garganta por um instante, então acharam seu caminho na descida.

De canto de olho, eu capturei as sobrancelhas erguidas de Patch.

Eu considerei explicar que eu era anêmica e que tinha que tomar ferro algumas vezes por dia, especialmente quando estava estressada, mas eu pensei melhor. A anemia não era uma questão de vida ou morte... contanto que eu tomasse doses regulares de ferro. Eu não era paranóica ao ponto de pensar que Patch queria me ferir, mas de algum modo, minha condição médica era uma vulnerabilidade que parecia melhor guardada em segredo.

“Nora?”

O Treinador ficou de pé na frente da sala, sua mão esticada em um gesto que mostrava que ele estava esperando por uma coisa – minha resposta. Uma queimação vagarosa achou seu caminho até as minhas bochechas.

“Você poderia repetir a pergunta?” eu perguntei.

A sala deu risinhos.

O Treinador disse, com uma leve irritação, “Quais as qualidade que te atraem em um parceiro em potencial?”

“Parceiro em potencial?”

“Vamos lá, não temos a tarde toda.”

Eu conseguia ouvir a Vee rindo atrás de mim.

Minha garganta pareceu se contrair. “Você quer que eu liste características de um...?”

“Parceiro em potencial, sim, isso seria prestativo.”

Sem querer fazê-lo, eu olhei de lado para Patch. Ele estava relaxado em seu assento, quase preguiçosamente, estudando-me com satisfação. Ele deu um relampejo de seu sorriso de pirata e balbuciou, Estamos esperando.

Eu empilhei minhas mãos na mesa, esperando parecer mais contida do que eu me sentia. “Eu nunca pensei nisso antes.”

“Bem, pense rápido.”

“Você poderia chamar outra pessoa primeiro?”

O Treinador gesticulou impacientemente para a minha esquerda. “É com você, Patch.”

Ao contrário de mim, Patch falou com confiança. Ele se posicionou para que seu corpo ficasse virado ligeiramente na direção do meu, nossos joelhos a meros centímetros de distância.

“Inteligente. Atraente. Vulnerável.”

O Treinador estava ocupado listando os adjetivos no quadro. “Vulnerável?” ele perguntou. “Como assim?”

Vee falou. “Isso tem alguma coisa a ver com a unidade que estamos estudando? Porque eu não consigo achar nada sobre características desejadas em um parceiro em lugar alguma do nosso texto.”

O Treinador parou de escrever tempo o bastante para olhar sobre seu ombro. “Todos os animais no planeta atraem parceiros com o objetivo de reproduzir. Sapos incham seus corpos. Gorilas machos batem em seus peitos. Você já observou uma lagosta macho subir nas pontas dos pés e estalar suas garras, exigindo a atenção da fêmea? Atração é o primeiro elemento de toda a reprodução animal, incluindo os humanos. Por que não nos dá a sua lista, Srta. Sky?”

Vee levantou cinco dedos. “Lindo, rico, indulgente, ferozmente protetor, e só um pouquinho perigoso.” Um dedo descia com cada descrição.

Patch riu baixinho. “O problema com a atração humana é não saber se ela será retornada.”

“Excelente argumento,” o Treinador disse.

“Humanos são vulneráveis,” Patch continuou, “porque são capazes de se magoar.” Com isso o joelho de Patch bateu contra o meu. Eu me afastei, não ousando me deixar perguntar o que ele queria dizer com o gesto.

O Treinador acenou. “A complexidade da atração humana – e da reprodução – é uma das características que nos diferenciam das outras espécies.”

Eu pensei ter ouvido Patch bufar com isso, mas foi um som muito suave, e eu não consegui ter certeza.

O Treinador continuou, “Desde o começo dos tempos as mulheres se atraíram por parceiros com habilidades de sobrevivência fortes – como inteligência e proeza física – porque homens com essas qualidades tem mais chances de trazer a janta para casa no final do dia.” Ele levantou dois dedões no ar e sorriu. “Janta equivale a sobrevivência, time.”

Ninguém riu.

“Igualmente,” ele continuou, “os homens são atraídos pela beleza porque indica saúde e juventude – não há razão para se acasalar com uma mulher doente que não estará por perto para criar as crianças.” O Treinador empurrou seu óculos até a ponte do nariz e deu risada.

“Isso é tão sexista,” Vee protestou. “Me conte alguma coisa que se relacione a uma mulher no século vinte e um.”

“Se você abordar a reprodução aos olhos da ciência, Senhoria Sky, você verá que as crianças são a chave para a sobrevivência da nossa espécie. E quanto mais filhos você tem, maior a sua contribuição para o patrimônio genético.”

Eu praticamente escutei os olhos da Vee girando. “Eu acho que finalmente estamos chegando perto do tópico de hoje. Sexo.”

“Quase,” disse o Treinador, levantando um dedo. “Antes do sexo vem a atração, mas depois da atração vem a linguagem corporal. Você tem que comunicar ‘Estou interessado’ para um parceiro em potencial, só que não em tantas palavras.”

O Treinador apontou para o meu lado. “Certo, Patch. Digamos que você está numa festa. A sala está cheia de meninas de todas as formas e tamanhos diferentes. Você vê loiras, morenas, ruivas, algumas meninas de cabelo preto. Algumas são extrovertidas, enquanto outras aparentam ser tímidas. Você achou uma garota que encaixe no seu perfil – atraente, inteligente, e vulnerável. Como você a deixa saber que está interessado?”

“Escolho-a. Falo com ela.”

“Bom. Agora para a pergunta principal – como você sabe se ela está na sua ou se ela quer que você continue andando?”

“Eu a estudo,” Patch diz. “Eu descubro o que ela está pensando e sentindo. Ela não vai vir de supetão e me contar, e é por isso que eu tenho de prestar atenção. Ela vira seu corpo em direção ao meu? Ela olha nos meus olhos, então

desvia o olhar? Ela morde seu lábio e brinca com seu cabelo, como a Nora está fazendo agora?”

Risadas cresceram na sala. Eu derrubei minhas mãos em meu colo.

“Ela está na minha,” disse Patch, batendo na minha perna novamente. De todas as coisas, eu corei.

“Muito bem! Muito bem!” o Treinador disse, sua voz carregada, sorrindo amplamente para a nossa atenção.

“As veias de sangue no rosto da Nora estão se alargando e a pele dela está esquentando,” Patch disse. “Ela sabe que está sendo avaliada. Ela gosta da atenção, mas ela não tem certeza de como lidar com isso.”

“Eu não estou corando.”

“Ela está nervosa,” Patch disse. “Ela está acariciando seu braço para tirar a atenção de seu rosto para seu corpo, ou talvez para a pele dela. Ambos são pontos vencedores fortes.”

Eu quase engasguei. Ele está brincando, eu disse a mim mesma. Não, ele é insano. Eu não tenho experiência em lidar com lunáticos, e aparecia. Eu sentia que eu passava a maior parte do nosso tempo juntos encarando Patch, de boca aberta. Se eu tinha qualquer ilusão sobre ficar no mesmo nível dele, eu ia ter que bolar uma nova abordagem.

Eu coloquei minhas mãos contra a mesa, levantei meu queixo, e tentei parecer como se eu ainda possuísse alguma dignidade. “Isso é ridículo.”

Esticando seu braço ao seu lado com uma dissimulação exagerada, Patch o pendurou nas costas da minha cadeira. Eu tinha o estranho pressentimento que isso era uma ameaça mirada diretamente a mim, e que ele estava alheio e indiferente de como a turma recebia isso. Eles riam, mas ele não parecia ouvir, segurando os meus olhos tão unicamente com os seus próprios que eu quase acreditava que ele tinha esculpido um mundo pequeno e privado para nós que ninguém mais podia alcançar.

Vulnerável, ele balbuciou.

Eu travei meus tornozelos ao redor das pernas da minha cadeira e dei um solavanco para frente, sentindo o peso do braço dele cair das costas do assento. Eu não era vulnerável.

“E aí está!” o Treinador disse. “Biologia em ação.”

“Podemos por favor falar sobre sexo agora?” perguntou Vee.

“Amanhã. Leiam o capítulo sete e estejam prontos para uma discussão imediata.”

O sinal tocou, e Patch rangeu sua cadeira. “Isso foi divertido. Vamos fazer de novo algum dia.” Antes que eu pudesse bolar algo mais incisivo do que não, obrigada, ele se debruçou atrás de mim e desapareceu para fora da porta.

“Eu vou começar uma petição para despedirem o Treinador,” Vee disse, vindo até a minha mesa. “O que foi a aula hoje? Foi um pornô aguado. Ele praticamente colocou você e Patch em cima da sua mesa, na horizontal, sem suas roupas, fazendo A Coisa –”

Eu a focalizei com um olhar que dizia, Parece que eu quero uma repetição?

“Noossa,” Vee disse, recuando.

“Eu preciso falar com o Treinador. Te encontro no armário em dez minutos.”

“Sem dúvida.”

Eu caminhei até a mesa do Treinador, onde ele estava sentado encurvado sobre um livro de jogadas de basquete. Ao primeiro olhar, todos os Xs e Os faziam parecer que ele estava jogando jogo da velha.

“Oi, Nora,” ele disse em olhar para cima. “O que posso fazer por você?”

“Estou aqui para te dizer que seu novo mapa de assento e plano de aula está me deixando desconfortável.”

O Treinador relaxou em sua cadeira e dobrou suas mãos atrás de sua cabeça. “Eu gosto do mapa de assentos. Quase tanto quanto eu gosto desse jogo de homem-a-homem em que estou trabalhando para o jogo de sábado.”

Eu coloco uma cópia do código de conduta e direitos estudantis da escola bem no topo dele. “Por lei, nenhum estudante deveria se sentir ameaçado nas propriedades escolares.”

“Você se sente ameaçada?”

“Eu me sinto desconfortável. E eu gostaria de propor uma solução.” Quando o Treinador não me cortou, eu inspirei um sopro de confiança. “Eu monitorarei qualquer estudante das suas aulas de biologia – se você me sentar ao lado da Vee novamente.”

“Patch podia ser monitorado.”

Eu resisti cerrar meus dentes. “Isso acaba com o propósito.”

“Você o viu hoje? Ele estava envolvido na discussão. Eu não o ouvi dizer uma palavra o ano todo, mas eu coloco ele ao seu lado e – bingo. A nota dele aqui vai melhorar.”

“E a da Vee vai cair.”

“Isso acontece quando você não pode olhar pro lado pra pegar a resposta certa,” ele disse secamente.

“O problema da Vee é falta de dedicação. Eu monitorarei ela.”

“Nada feito.” Olhando para seu relógio, ele disse, “Estou atrasado para uma reunião. Acabamos aqui?”

Eu fiquei parada com a minha boca entreaberta, espremendo o meu cérebro para cuspir mais um argumento. Mas parecia que eu estava sem inspiração.

“Vamos dar ao mapa de assento mais algumas semanas. Ah, e eu falei sério sobre monitorar Patch. Vou considerar você dentro.” O Treinador não esperou pela minha resposta; ele assobiou a música tema de Jeopardy e mergulhou para fora da porta.

Às sete horas o céu tinha escurecido para um azul enegrecido, e eu fechei meu casaco para me aquecer. Vee e eu estávamos a caminho do cinema para o estacionamento, tendo acabado de assistir O Sacrifício.

Era meu trabalho resenhar filmes para o eZine, e já que eu já tinha visto todos os outros filmes passando no cinema, tínhamos nos resignado ao último suspense urbano.

“Esse,” Vee disse, “foi o filme mais bizarro que eu já vi. Como regra, não temos mais permissão de ver nada que sugira horror.

Por mim tudo bem. Levando em consideração que alguém estivera espreitando do lado de fora da janela do meu quarto na noite passada e combinando isso com um filme totalmente desenvolvido sobre um perseguidor essa noite, e eu estava começando a me sentir um tantinho paranóica.

“Consegue imaginar?” Vee disse. “Viver sua vida toda não tendo uma pista de que a única razão para que você é mantida viva é para ser usada como um sacrifício?”

Ambas estremecemos.

“E qual era a daquele altar?” ela continuou, irritantemente alheia que eu teria preferido falar sobre o círculo da vida de um fungo do que sobre o filme. “Por que aquele cara mau tocou fogo na pedra antes de amarrá-la? Quando eu escutei a carne dela chiar –”

“Está certo!” Eu praticamente gritei. “Para onde agora?”

“E posso só dizer que se um cara alguma vez me beijar desse jeito, eu vou começar a vomitar. Repulsivo não consegue descrever o que acontecia com a boca dele. Aquilo era maquiagem, certo? Quero dizer, ninguém realmente tem uma boca como aquela na vida real –”

“Minha resenha é para a meia-noite,” eu disse, cortando-a.

“Ah. Certo. Para a biblioteca, então?” Vee destrancou as portas de seu Dodge Neon roxo 1995. “Você está sendo terrivelmente sensível, sabe.”

Eu deslizei para o assento do passageiro. “Culpa do filme.” Culpa do pervertido na minha janela ontem a noite.

“Não estou falando só sobre hoje a noite. Eu notei,” ela disse com uma travessa curva de sua boca, “que você ficou excepcionalmente mal-humorada por uma boa meia hora no final da aula de biologia nos últimos dois dias.”

“Fácil também. Culpe o Patch.”

Os olhos da Vee moveram-se rapidamente para o espelho retrovisor. Ela o ajustou para olhar melhor seus dentes. Ela os lambeu, dando um sorriso praticado.

“Eu tenho que admitir, o lado obscuro dele me atrai.”

Eu não tinha desejo algum de admitir isso, mas Vee não estava sozinha. Eu me sentia atraída por Patch de uma maneira que eu nunca me senti atraída por ninguém. Havia um magnetismo obscuro entre nós. Perto dele, eu me sentia atraída pelos precipícios do perigo. A qualquer momento, parecia que ele podia me empurrar do precipício.

“Ouvir você dizer isso me fazer querer –” eu parei, tentando pensar exatamente no que a nossa atração pelo Patch me fazia querer fazer. Algo desagradável.

“Me diga que você não acha que ele é bonito,” Vee disse, “e eu prometo que nunca trarei o nome dele a tona novamente.”

Eu estiquei meu braço para ligar o rádio. De tudo, devia haver algo melhor a fazer do que arruinar a nossa noite convidando Patch, mesmo que de forma abstrata, para ela. Sentar ao lado dele por uma hora todo dia, cinco dias por semana, era muito mais do que eu podia aguentar. Eu não lhe daria minhas noites também.

“Bem?” Vee pressionou.

“Ele pode ser bonito. Mas eu seria a última a saber. Eu sou uma jurada maculada nessa questão, desculpa.”

“O que isso quer dizer?”

“Quer dizer que eu não consigo passar pela personalidade dele. Nenhuma quantidade de beleza pode compensá-la.”

“Beleza não. Ele é... ousado. Sexy.”

Eu girei meus olhos.

Vee buzinou e bateu em seu freio enquanto um carro parava na frente dela.

“O quê? Você discorda, ou rude-e-diabólico não é o seu tipo?”

“Eu não tenho um tipo,” eu disse. “Não sou tão restrita.”

Vee riu. “Você, querida, é mais do que restrita – você é confinada. Limitada. Seu espectro é tão largo quanto um dos micro-organismos do Treinador. Há muitos poucos, se há algum, garotos na escola por quem você ficaria caída.”

“Isso não é verdade.” Eu disse as palavras automaticamente. Não foi até eu tê-las dito que eu me perguntei o quanto eram acuradas. Eu nunca estive seriamente interessada em ninguém. Como eu era estranha. “Não tem a ver com garotos, tem a ver com... amor. Eu não o achei.”

“Não tem a ver com amor,” Vee disse. “Tem a ver com diversão.”

Eu levantei minhas sobrancelhas, duvidosa. “Beijar um cara que eu não conheço – que eu não gosto – é divertido?”

“Você não esteve prestando atenção na aula de biologia? É muito mais do que beijar.”

“Ah,” eu disse em uma voz iluminada. “O patrimônio genético está deturpado o bastante sem eu contribuir com ele.”

“Quer saber quem eu acho que seria realmente bom?”

“Bom?”

“Bom?” ela repetiu com um sorriso indecente.

“Não particularmente.”

“O seu parceiro.”

“Não chame ele disso,” eu disse. “Parceiro tem uma conotação positiva.”

Vee espremeu-se em uma vaga próxima das portas da biblioteca e deixou o motor morrer. “Você já fantasiou sobre beijá-lo? Você já deu uma espiadinha de lado e imaginou se jogar no Patch e comprimir sua boca contra a dele?”

Eu encarei ela com um olhar que esperava transmitir um choque alarmado. “Você já deu?”

Vee sorriu.

Eu tentei imaginar o que Patch faria se fosse apresentado a essa informação. Do pouco que eu sabia sobre ele, eu sentia sua aversão pela Vee como se fosse concreta o bastante para tocar.

“Ele não é bom o bastante para você,” eu disse.

Ela gemeu. “Cuidado, você só vai fazer eu querer ele ainda mais.”

Dentro da biblioteca nós pegamos uma mesa no térreo, perto de ficção adulta. Eu abri meu laptop e digitei: O Sacrifício, duas estrelas e meia. Duas e meia provavelmente era baixo. Mas eu tinha muito na minha mente e não estava me sentindo particularmente justa.

Vee abriu um saco de chips de maça seca. “Quer um pouco?”

“Não, obrigada.”

Ela espiou dentro do saco. “Se você não vai comê-las, eu terei que. E eu realmente não quero.”

Vee estava na dieta da fruta roleta-da-cor. Três frutas vermelhas por dia, duas azuis, um punhado de verdes...

Ela levantou um chip de maça, examinando-o de frente e de costas.

“Que cor?” eu perguntei.

“Verde-maça-de-fazer-vomitar-ovas-de-peixe. Eu acho.”

Bem então Marcie Millar, a única estudante do segundo ano do time de líderes de torcida na história da Coldwater High, tomou um assento na beirada de nossa mesa. Seu cabelo loiro morango estava penteado em marias-chiquinhas baixas, e como sempre, sua pele estava oculta debaixo de meio tubo de base. Eu estava positivamente certa de que tinha acertado a quantidade certa, já que não havia um traço de suas sardas a vista. Eu não via as sardas da Marcie desde a sétima série, o mesmo ano em que ela descobriu Mary Kay9. Havia três quartos de dois centímetros entre a bainha de sua saia e o começo de sua calcinha... se ela estava ao menos usando uma.

“Oi, Gigante,” Marcie disse para Vee.

“Oi, Aberração,” Vee disse de volta.

“Minha mãe está procurando por modelos esse final de semana. O pagamento é nove dólares por hora. Pensei que você poderia estar interessada.”

A mãe da Marcie gerencia a JCPenney10 local, e nos finais de semana ela faz a Marcie e o resto das líderes de torcida modelaram em biquínis na janela de exposição encarando a rua da loja.

“Ela está tendo muita dificuldade em achar modelos de lingerie plus-size,” disse Marcie.

“Você tem comida presa nos seus dentes,” Vee disse a Marcie. “Na fenda entre os seus dois dentes da frente. Parece com o chocolate Ex-Lax11...”

Marcie lambeu seus dentes e deslizou da mesa. Enquanto ela ia embora gingando, Vee enfiou seu dedo em sua boca e fez gestos de vômito para as costas da Marcie. “Ela tem sorte de estarmos na biblioteca,” Vee me disse. “Ela tem sorte de não termos nos cruzado em um beco escuro. Última chance – quer chips?”

“Passo.”

9 Empresa americana de venda direta de cosméticos, fundada em 1963 em Dallas, Texas (EUA), por Mary Kay Ash.

10 Cadeia de lojas de departamento dos EUA.

11 Laxante em forma e com gosto de chocolate.

Vee vagou para descartar os chips. Alguns minutos depois ela retornou com um livro de romance. Ela tomou o assento ao meu lado e, mostrando a capa do livro, disse, “Algum dia seremos nós. Arrebatadas por caubóis parcialmente vestidos. Eu me pergunto como é beijar um par de lábios queimados pelo sol e com crostas de lama?”


“Sujo,” eu murmurei, digitando.

“Falando em sujo.” Houve um aumento inesperado em sua voz. “Lá está o nosso menino.”

Eu parei de digitar tempo o bastante para espiar sobre meu laptop, e meu coração pulou uma batida. Patch estava de pé do outro lado da sala na fila de empréstimo. Como se ele tivesse me sentido observando-o, ele se virou. Nossos olhos se trancaram por um, dois, três instantes. Eu quebrei-o primeiro, mas não antes de receber um sorriso vagaroso.

As batidas do meu coração ficaram erráticas, e eu disse a mim mesma para me controlar. Eu não ia ir por essa estrada. Não com o Patch. Não a não ser que eu estivesse louca.

“Vamos,” eu disse a Vee. Fechando meu laptop, eu o fechei dentro de sua pasta. Eu empurrei meus livros dentro da minha mochila, derrubando alguns no chão enquanto o fazia.

Vee disse, “Estou tentando ler o título que ele está segurando... espera aí… Como Ser um Perseguidor.”

“Ele não está emprestando um livro com esse título.” Mas eu não estava certa.

“É ou esse ou Como Irradiar Sensualidade Sem Tentar.”

“Shh!” Eu sibilei.

“Acalme-se, ele não consegue ouvir. Ele está falando com a bibliotecária. Ele está indo embora.”

Confirmando isso com uma rápida olhada, eu percebi que se fôssemos embora agora, provavelmente o encontraríamos na porta de saída. E então seria esperado que eu dissesse algo para ele. Eu me ordenei a voltar para a minha cadeira e procurei diligentemente nos meus bolsos por coisa alguma enquanto ele terminava de sair.

“Você acha que é sinistro ele estar aqui na mesma hora que nós?” Vee perguntou.

“Você acha?”

“Eu acho que ele está te seguindo.”

“Eu acho que é uma coincidência.” Isso não era inteiramente verdade. Se eu tivesse que fazer uma lista dos dez lugares em que eu esperaria encontrar Patch

em qualquer noite, a biblioteca pública não entraria. A biblioteca não entraria nos cem lugares. Então o que ele estava fazendo aqui?

A pergunta era particularmente perturbadora depois do que acontecera ontem a noite. Eu não tinha mencionado isso para Vee porque eu esperava que isso encolhesse e murchasse na minha memória até parasse de ter acontecido. Ponto.

“Patch!” Vee fingiu sussurrar. “Você está perseguindo a Nora?”

Eu fixei minha mão sobre a boca dela. “Para com isso. Falo sério.” Eu fiz uma cara severa.

“Aposto que ele está te seguindo,” disse Vee, forçando a minha mão a sair. “Eu aposto que ele tem um histórico disso também. Eu aposto que ele tem medidas cautelares. Deveríamos entrar escondidas no escritório principal. Tudo deve estar na ficha estudantil dele.”

“Não vamos entrar escondidas no escritório principal.”

“Eu podia criar uma distração. Sou boa em distrações. Ninguém veria você entrar. Poderíamos ser como espiãs.”

“Não somos espiãs.”

“Sabe o sobrenome dele?” Vee perguntou.

“Não.”

“Sabe alguma coisa sobre ele?”

“Não. E eu gostaria de continuar desse jeito.”

“Ah, vamos lá. Você ama um bom mistério, e não fica melhor que isso.”

“Os melhores mistérios envolvem um corpo morto. Não temos um corpo morto.”

Vee deu um gritinho. “Ainda não!”

Chacoalhando duas pílulas de ferro da garrafa na minha mochila, eu as engoli juntas.

Vee fez o Neon saltar em sua entrada logo depois das nove e meia. Ela desligou o motor e balançou as chave na minha frente.

“Você não vai me levar para casa?” eu perguntei. Um desperdício de fôlego, já que eu sabia a resposta dela.

“Tem névoa.”

“Uma névoa remendada12.”

Vee sorriu. “Ah, cara. Ele está tão na sua mente. Não que eu te culpe. Pessoalmente, estou esperando sonhar com ele hoje a noite.”

12 No original, ‘patchy’, que significa remendo e é um trocadilho com o nome do Patch.

Argh.

“E a névoa sempre piora perto da sua casa,” Vee continuou.

“Me assusta depois de escuro.”

Eu agarrei as chaves. “Muito obrigada.”

“Não me culpe. Diga a sua mãe para se mudar mais pra perto. Diga a ela que tem esse clube novo chamado civilização e que vocês deveriam se juntar.”

“Suponho que espera que eu te pegue antes da escola amanhã?”

“As sete e meia seria bom. Café da manhã por minha conta.”

“É melhor que seja bom.”

“Seja boazinha com o meu bebê.” Ela deu um tapinha no para-lama do Neon. “Mas não boazinha demais. Não posso fazê-la pensar que tem melhor aí fora.”

Na viagem para casa eu permiti que meus pensamentos fizessem uma pequena viagem para Patch.

Vee estava certa – algo sobre ele era incrivelmente sedutor. E incrivelmente sinistro. Quanto mais eu pensava sobre isso, mais eu estava convencida de que algo nele era... estranho. O fato dele gostar de me antagonizar não era exatamente digno de notícia, mas havia uma diferença entre me irritar durante a aula e possivelmente me seguir até a biblioteca para conseguir isso. Não são muitas as pessoas que se dariam a tanto trabalho... a não ser que tivessem uma boa razão.

Na metade do caminho para casa uma chuva incitou nuvens finas a cobrirem a estrada. Dividir minha atenção entre a estrada e os controles no volante, eu tentei localizar os limpadores.

As luzes da rua relinchavam acima e eu me perguntei se uma tempestade mais forte estava se aproximando. Tão perto assim do oceano o clima mudava constantemente, e uma pancada de chuva podia rapidamente se transformar em uma inundação.

Eu acelerei o Neon.

As luzes do lado de fora piscaram novamente. Um pressentimento gelado espetou a parte de trás do meu pescoço, e os pelos nos meus braços formigaram. Meu sexto sentido passou para um alerta máximo. Eu me perguntei se eu achava que estava sendo seguida. Não havia faróis no espelho retrovisor.

Nada de carros a frente, tampouco. Eu estava completamente sozinha. Não era um pensamento muito confortante. Eu acelerei o carro para setenta quilômetros.

Eu achei o limpador, mas mesmo na velocidade máxima eles não conseguiam manter o ritmo da chuva martelante. O sinaleiro a frente ficou amarelo.

Eu parei, chequei para ver se o tráfego estava vazio, então fui para a cruzamento.

Eu escutei o impacto antes de registrar a silhueta negra derrapando pelo capô do carro.

Eu gritei e pisei fundo no freio. A silhueta golpeou contra o para-brisa com uma explosão estilhaçante.

Em impulso, eu virei duramente o volante para a direita. O final do Neon desacelerou, mandando-me girando no cruzamento. A silhueta rolou e desapareceu pela beirada do capô.

Eu estava segurando minha respiração, apertando o volante entre minhas mãos de dobras brancas. Eu levantei meu pé dos pedais. O carro moveu-se rapidamente e parou.

Ele estava agachado a alguns metros, me observando. Ele não parecia nem um pouco... ferido.

Ele estava vestido totalmente de preto e misturava-se a noite, dificutando dizer como ele era. De primeira eu não consegui distinguir nenhum traço facial, e então eu percebi que ele estava usando uma máscara de esqui.

Ele ficou de pé, fechando a distância entre nós. Ele achatou suas palmas na janela do lado do motorista. Nossos olhos se conectaram através dos buracos na máscara. Um sorriso letal pareceu crescer nos dele.

Ele deu outro golpe, o vidro vibrando entre nós.

Eu dei partida no carro. Eu tentei sincronicamente colocá-lo na primeira marcha, empurrar o acelerador e soltar a embreagem. O motor entrou em movimento, mas o carro moveu-se rapidamente de novo e morreu.

Eu liguei o motor mais uma vez, mas fui distraída por um rosnado metálico desafinado. Eu observei com horror enquanto a porta começava a dobrar. Ele estava arrancando – ela – fora. Eu calquei o carro na primeira. Meus sapatos deslizaram por sobre os pedais.

O motor rugiu, a agulha de RPM13 no painel cravando na zona vermelha.

Seu punho passou pela janela numa explosão de vidro. Sua mão tateou meu ombro, fixando-se ao redor da minha mão. Eu dei um grito rouco, pisou com força no acelerador, e soltei a embreagem. O Neon guinchou em movimento. Ele segurou, apertando a minha mão, correndo ao lado do carro por diversos metros antes de soltar.

13 Do inglês revolutions/rounds per minute, ou seja, giros por minuto.

Eu acelerei para frente com a força da adrenalina. Eu chequei o espelho retrovisor para ter certeza de que ele não estava me perseguindo, então empurrei o espelho para encarar a distância. Eu tive que pressionar os meus lábios juntos para impedi-los de soluçar.


                                    Capítulo 4

VOANDO POR HAWTHORNE, EU PASSEI PELA MINHA casa, dei a volta, cortei até Beech, e me dirigi de volta em direção ao centro de Coldwater. Eu disquei o número da Vee através da agenda eletrônica.


“Algo aconteceu – eu – ele – a coisa – do nada – o Neon –”

“Está falhando. O quê?”

Eu limpei meu nariz com as costas da minha mão. Eu estava tremendo até meus dedos do pé. “Ele surgiu do nada.”

“Quem?”

“Ele –” eu tentei prender meus pensamentos e canalizá-los em palavras. “Ele pulou na frente do carro!”

“Ai, cara. Ai-cara-ai-cara-ai-cara. Você acertou um veado? Você está bem? E o Bambi?” Ela meio choramingou, meio gemeu. “O Neon?”

Eu abri minha boca, mas Vee me cortou.

“Esquece. Eu tenho seguro. Só me diga que não tem pedaços de veado em todo o meu bebê... Nada de pedaços de veado, certo?”

Qualquer resposta que eu estive prestes a dar se dissipou no plano de fundo. Minha mente estava dois passos na frente. Um veado. Talvez eu conseguisse fazer o negócio todo parecer com uma batida em um veado. Eu queria me confidenciar na Vee, mas eu não queria soar louca, tampouco. Como eu ia explicar assistir ao cara que eu tinha atingido se levantar e começar a arrancar a porta do carro? Eu estiquei meu colarinho para baixo do meu ombro. Nenhuma marca vermelha onde ele tinha me agarrado, que eu conseguisse ver...

Eu me dei conta de mim mesma com assombro. Eu realmente estava considerando negar o que tinha acontecido? Eu sabia o que eu tinha visto. Não foi a minha imaginação.

“Santa bizarrice,” Vee disse. “Você não está respondendo. O veado está preso nos faróis, não está? Você está dirigindo por aí com ele travado na frente do carro como um trator para evacuar neve.”

“Posso dormir na sua casa?” Eu queria sair das ruas. Sair da escuridão. Com uma inspiração súbita de ar, eu percebi que para ir para a casa da Vee, eu teria que dirigir de volta pelo cruzamento onde eu tinha atingido-o.

“Eu estou no meu quarto,” disse Vee. “Pode entrar. Te vejo daqui a pouco.”

Com as minhas mãos apertadas no volante, eu empurrei o Neon pela chuva, rezando para que o sinal em Hawthorne estivesse verde em meu favor. Estava, e eu ladrilhei pelo cruzamento, mantendo meus olhos diretamente a frente, mas ao mesmo tempo, roubando olhadelas para as sombras ao lado da estrada. Não havia sinal do cara de máscara de esqui.

Dez minutos mais tarde eu estacionei o Neon na entrada da Vee. O dano à porta era extensivo, e eu tive que colocar meu pé nela e chutar para conseguir sair. Então eu corri para a porta da frente, escapuli para dentro, e corri pela escada do porão.

Vee estava sentada de pernas cruzadas em sua cama, o caderno apoiado em seus joelhos, os fones enfiados, o iPod ligado no máximo. “Eu quero ver o dano hoje a noite, ou devo esperar até ter pelo menos tido sete horas de sono?” ela disse por cima da música.

“Talvez a opção número dois.”

Vee fechou o caderno e tirou os fones. “Vamos acabar com isso logo.”

Quando fomos para fora, eu encarei o Neon por um longo tempo. Não era uma noite quente, mas o tempo não era a causa dos arrepios ondulando nos meus braços. Nada de janela do lado do motorista quebrada. Nada de amasso na porta.

“Algo não está certo,” eu disse. Mas Vee não estava escutando. Ela estava ocupada inspecionando cada centímetro quadrado do Neon.

Eu dei um passo para frente e cutuquei a janela do lado do motorista. Vidro sólido. Eu fechei meus olhos. Quando eu os reabri, a janela ainda estava intacta.

Eu dei uma volta pela traseira do carro. Eu tinha quase completado uma volta inteira quando eu parei de imediato.

Uma fina rachadura no para-brisa.

Vee a viu ao mesmo tempo. “Tem certeza de que não foi um esquilo?”

Minha mente relampejou de volta para os olhos letais atrás da máscara de esqui. Eles eram tão negros que eu não conseguia distinguir as pupilas das íris. Negros como... os de Patch.

“Olhe para mim, estou chorando lágrimas de alegria,” Vee disse, esparramando-se sobre o capô do Neon em um abraço. “Uma rachadura minusculinha. Só isso!”

Eu fabriquei um sorriso, mas meu estômago azedou-se. Há cinco minutos, a janela estava quebrada e a porta estava curvada. Olhando para o carro agora, parecia impossível. Não, parecia loucura. Mas eu vi o punho dele dar um soco no vidro, e eu senti as unhas dele mordiscarem meu ombro.

Não tinha?

Quanto mais eu tentava relembrar da batida, mais eu não conseguia. Pequenas manchas de informação perdida cruzavam minha memória. Os detalhes estavam se dissipando. Ele era alto? Baixo? Magro? Grande? Ele tinha dito alguma coisa?

Eu não conseguia me lembrar. Essa era a parte mais assustadora.

Vee e eu deixamos sua cama as sete e quinze na manhã seguinte e dirigimos até o Enzo’s Bistro para tomar de café da manhã leite fervido. Com minhas mãos encaixadas ao redor da minha xícara de porcelana, eu tentei aquecer o frio profundo dentro de mim. Eu tinha tomado banho, colocado uma veste de baixo e um cardigã emprestados do armário da Vee, e posto um pouco de maquiagem, mas eu mal lembrava de ter feito isso.

“Não olhe agora,” Vee disse. “mas o Sr. Suéter Verde fica olhando para cá, estimando suas longas pernas pela sua calça jeans... Ah! Ele acabou de me saudar. Não estou brincando. Uma saudaçãozinha militar de dois dedos. Que adorável.”

Eu não estava escutando. O acidente da noite passada tinha repassado inteiramente na minha cabeça a noite toda, perseguindo qualquer chance de sono. Meus pensamentos estavam embaralhados, meus olhos estavam secos e pesados, e eu não conseguia me concentrar.

“O Sr. Suéter Verde parece normal, mas o companheiro dele parece um bad boy da pesada,” disse Vee. “Emite um certo sinal não-mexa-comigo. Diz que ele não parece com a cria do Drácula. Diz que eu estou imaginando coisas.”

Levantando meus olhos justamente o bastante para dar uma olhada nele sem parecer que eu estava, eu absorvi seu rosto lindo de ossos suaves. Cabelo loiro pairava em seus ombros. Olhos da cor de cromo. Barba por fazer. Impecavelmente vestido em uma jaqueta impecável e calça jeans escura de designer. Eu disse, “Você está imaginando coisas.”

“Você deixou passar os olhos inexpressivos? A linha capilar em V? O porte alto e esbelto? Ele talvez até seja alto o bastante para mim.”

Vee tem quase 1,83 metros, mas ela tem uma quedinha por saltos. Saltos altos. Ela também tem uma regra sobre não namorar caras baixos.

“Está bem, qual o problema?” Vee perguntou. “Você ficou toda incomunicável. Isso não é por causa da rachadura no para-brisa, é? E daí que você atingiu um animal? Podia acontecer a qualquer um. Claro, as chances seriam muito menores se a sua mãe se mudasse do mato.”

Eu ia contar a Vee a verdade sobre o que tinha acontecido. Em breve. Eu só precisava de um pouco de tempo para ordenar os detalhes. O problema era que eu não via como eu poderia. Os únicos detalhes sobrando eram assustadores, na melhor das hipóteses. Era como se uma borracha tivesse apagado a minha memória. Pensando de volta, eu me lembrava da chuva pesada caindo como cascata nas janelas do Neon, fazendo com que tudo ficasse borrado. Eu teria de fato atingido um veado?

“Hmm, dá uma olhada nisso,” disse Vee. “O Sr. Suéter Verde está saindo do seu assento. Agora, esse é um corpo que frequenta a academia regularmente. Ele definitivamente está caminhando na nossa direção, seus olhos procurando a propriedade, a sua propriedade, isso é.”

Uma meia batida mais tarde, fomos cumprimentadas por um baixo e agradável, “Olá.”

Vee e eu olhamos para cima ao mesmo tempo. O Sr. Suéter Verde estava atrás da nossa mesa, seus dedões presos nos bolsos de sua calça jeans. Ele tinha olhos azuis, com cabelo loiro estilosamente bagunçado arrastado em sua testa.

“Olá para você,” Vee disse. “Eu sou Vee. Esta é Nora Grey.”

Eu franzi para Vee. Eu não apreciava ela anexando meu sobrenome, sentindo que isso violava um contrato não-verbal entre meninas, ainda mais melhores amigas, ao encontrar garotos desconhecidos. Eu dei um aceno indiferente e trouxe minha xícara aos meus lábios, imediatamente queimando minha língua.

Ele arrastou uma cadeira da mesa ao lado e se sentou de costas nela, seus braços descansando onde suas costas deveriam estar. Esticando uma mão para mim, ele disse, “Eu sou Elliot Saunders.” Sentindo-me formal demais, eu apertei-a. “E esse é Jules,” ele acrescentou, sacudindo seu queixo na direção de seu amigo, que Vee tinha subestimado grosseiramente ao chamar de “alto”.

Jules abaixou todo o seu eu em um assento ao lado de Vee, minimizando a cadeira.

Ela disse para ele, “Eu acho que você é o maior cara que eu já vi. Sério, quanto você mede?”

“Dois metros e oito,” Jules murmurou, tombando em seu assento e cruzando seus braços.

Elliot limpou sua garganta. “Posso pedir algo para as damas comerem?”

“Estou bem,” eu disse, levantando minha xícara. “Eu já pedi.”

Vee me chutou por debaixo da mesa. “Ela vai querer um sonho recheado de creme de baunilha. Na verdade, dois.”

“Lá se foi a dieta, hein?” eu perguntei a Vee.

“Hein para você. A fava de baunilha é uma fruta. Uma fruta marrom.”

“É um legume.”

“Você tem certeza disso?”

Eu não tinha.

Jules fechou seus olhos e apertou a ponte do seu nariz. Aparentemente ele estava tão animado de estar sentado conosco quanto eu estava de tê-los aqui.

Enquanto Elliot andava até o balcão frontal, eu deixei meus olhos arrastarem-se até ele. Ele definitivamente estava no ensino médio, mas eu não tinha visto ele na CHS antes. Eu me lembraria. Ele tinha uma personalidade charmosa e extrovertida que não se dissipava no plano de fundo. Se eu não estivesse me sentindo tão abalada, eu de fato poderia ter me interessado. Em amizade, talvez mais.

“Você mora por aqui?” Vee perguntou a Jules.

“Hmm.”

“Vai para escola?”

“Kinghorn Prep.” Havia uma matiz de superioridade no jeito como ele disse isso.

“Nunca ouvi falar.”

“Escola particular. Portland. Começamos as nove.” Ele levantou sua manga e olhou para seu relógio.

Vee mergulhou um dedo na espuma de seu leite e o lambeu. “É caro?”

Jules olhou para ela diretamente pela primeira vez. Seus olhos se esticaram, mostrando um pouco de branco ao redor das beiradas.

“Você é rico? Aposto que é,” ela disse.

Jules olhou Vee como se ela tivesse acabado de matar uma mosca na testa dele. Ele recuou sua cadeira várias centímetros, se distanciando de nós.

Elliot retornou com uma caixa com meia dúzia de sonhos.

“Dois de creme de baunilha para as damas,” ele disse, empurrando a caixa na minha direção, “e quatro com confeitos para mim. Acho que é melhor eu me encher agora, já que eu não sei como é a lanchonete na Coldwater High.”

Vee quase cuspiu seu leite. “Você frequenta a CHS?”

“A partir de hoje. Eu acabei de me transferir da Kinghorn Prep.”

“Nora e eu frequentamos a CHS,” Vee disse. “Espero que aprecie sua boa sorte. Qualquer coisa que precise saber – incluindo quem deve convidar para o Baile da Primavera – é só perguntar. Nora e eu não temos pares... ainda.”

Eu decidi que era hora de nos separarmos. Jules estava obviamente entediado e irritado, e ficar na companhia dele não estava ajudando o meu humor já impaciente. Eu fiz uma grande apresentação ao olhar no relógio do

meu celular e disse, “É melhor irmos para escola, Vee. Temos uma teste de biologia para o qual estudar. Elliot e Jules, foi bom conhecê-los.”

“Nosso teste de biologia não é até a sexta,” disse Vee.

Do lado de dentro, eu me contraio involuntariamente. Do lado de fora, eu sorrio descaradamente. “Certo. Eu quis dizer teste de inglês. As obras de... Geoffrey Chaucer.” Todos sabiam que eu estava mentindo.

De um jeito remoto minha grosseria me incomodava, especialmente já que Elliot não tinha feito nada para merecer isso. Mas eu não queria ficar mais sentada aqui. Eu queria continuar me movendo, me distanciando da noite passada. Talvez a memória diminuindo não fosse uma coisa tão ruim afinal. Quanto mais cedo eu esquecesse o acidente, mais cedo minha vida voltaria ao seu ritmo normal.

“Espero que tenha um ótimo primeiro dia, e talvez vejamos você no almoço,” eu disse a Elliot. Então eu arrastei Vee por seu cotovelo e a dirigi porta afora.

O dia escolar estava quase acabando, somente biologia faltando, e após uma rápida parada no meu armário para trocar livros, eu me dirigi para aula. Vee e eu chegamos antes de Patch; ela deslizou no assento vazio dele e cavou em sua mochila, puxando uma caixa de Hot Tamales14.

“Um, a fruta vermelha saindo já,” ela disse, oferecendo-me a caixa.

“Deixe-me advinhar... canela é uma fruta?” eu empurrei a caixa para longe.

“Você não almoçou, tampouco,” Vee disse, franzindo a testa.

“Não estou com fome.”

“Mentirosa. Você está sempre com fome. Isso tem a ver com Patch? Você não está preocupada que ele esteja realmente perseguindo você, está? Porque na noite passada, aquele negócio todo na biblioteca, eu estava brincando.”

Eu massageei círculos pequenos nas minhas têmporas. A dor maçante que tinha tomado residência atrás dos meus olhos resplandeceram na menção de Patch. “Patch é a última das minhas preocupações,” eu disse. Não era exatamente verdade.

“Meu assento, se não se importa.”

Vee eu olhamos para cima simultaneamente ao som da voz de Patch.

Ele soava feliz o bastante, mas ele manteve seus olhos treinados na Vee enquanto ela se levantava e atirava sua mochila por seu ombro. Parecia que ela

14 Doce de canela, em formato de 'tubinho', com um gosto ardido e apimentado.

não conseguia se mover rápida o bastante; ele passou seu braço pelo corredor, convidando-a para fora.

“Bonita como sempre,” ele disse para mim, tomando sua cadeira. Ele se reclinou, esticando suas pernas na sua frente. Eu sempre soubera que ele era alto, mas eu nunca tinha medido. Olhando para a extensão das pernas dele agora, eu pressupus que ele tivesse 1,83. Talvez até 1,85.

“Obrigada,” eu respondi sem pensar. Imediatamente eu quis retirar o que dissera. Obrigada? De todas as coisas que eu poderia ter dito, “obrigada” era a pior. Eu não queria que Patch pensasse que eu tinha gostado do elogio dele. Porque eu não tinha... na maior parte. Não precisava de muita percepção para perceber que ele era encrenca, e eu já tinha tido encrenca o bastante na minha vida. Não havia necessidade de convidar mais. Talvez se eu o ignorasse, ele eventualmente desistiria de puxar conversa. E então poderíamos sentar lado a lado em uma silenciosa harmonia, como todas as outras parcerias na sala.

“Você está cheirando bem também,” disse Patch.

“Chama-se banho.” Eu estava encarando diretamente a frente. Quando ele não respondeu, eu me virei de lado. “Sabonete. Shampoo. Água quente.”

“Pelada. Conheço o esquema.”

Eu abri minha boca para mudar de assunto quando o sinal me cortou.

“Coloquem seus livros de lado,” o Treinador disse de trás da sua mesa. “Vou dar um teste de treinamento para aquecê-los para o verdadeiro dessa sexta.” Ele parou na minha frente, lambendo seu dedo enquanto tentava separar os testes. “Eu quero quinze minutos de silêncio enquanto respondem as perguntas. Então discutiremos o capítulo sete. Boa sorte.”

Eu trabalhei nas primeiras questões, respondendo-as com uma efusão rítmica de fatos memorizados. Ao menos, o teste roubou minha concentração, empurrando o acidente da noite passada e a voz nos fundos da minha mente questionando a minha sanidade de lado. Parando para me livrar de uma câimbra da mão que escrevia, eu senti Patch se inclinar na minha direção.

“Você parece cansada. Noite difícil?” ele sussurrou.

“Eu te vi na biblioteca.” Tomei cuidado em deixar meu lápis deslizando por sobre o meu teste, parecendo concentrada no trabalho.

“O ponto alto da minha noite.”

“Você estava me seguindo?”

Ele reclinou sua cabeça e riu suavemente.

Eu tentei uma abordagem diferente. “O que você estava fazendo lá?”

“Pegando um livro.”

Eu senti os olhos do Treinador em mim e me dediquei ao teste. Após responder mais diversas perguntas, eu roubei uma olhadela à minha esquerda. Eu fiquei surpresa ao encontrar Patch já me observando. Ele sorriu.

Meu coração deu um salto inesperado, assustado por esse sorriso bizarramente atraente. Para o meu horror, eu fiquei tão alarmada que derrubei meu lápis. Ele saltou pelo tampo da mesa algumas vezes antes de rolar pela beirada. Patch se inclinou para apanhá-lo. Ele o segurou na palma de sua mão, e eu tive que me concentrar para não tocar na pele dele enquanto eu o pegava.

“Depois da biblioteca,” eu sussurrei. “Para onde você foi?”

“Por quê?”

“Você me seguiu?” eu exigi baixinho.

“Você parece um tanto irritada, Nora. O que aconteceu?” Suas sobrancelhas se levantaram em preocupação. Era tudo apresentação, porque havia uma faísca derrisória no centro de seus olhos negros.

“Você está me seguindo?”

“Por que eu iria querer te seguir?”

“Responda a pergunta.”

“Nora.” O aviso na voz do Treinador me chamou de volta para o teste. Mas eu não conseguia evitar especular sobre qual teria sido a resposta dele, e ela me fez querer deslizar para longe de Patch. Para o outro lado da sala. Para o outro lado do universo.

O Treinador gorjeou seu apito. “O tempo acabou. Passem seus testes para frente. Esperem perguntas similares nessa sexta. Agora” – ele juntou suas mãos, e o som seco dele me fez estremecer – “para a lição de hoje. Senhorita Sky, quer declarar o nosso tópico?”

“S-e-x-o,” Vee anunciou.

Precisamente após ela ter anunciado, eu desliguei. Patch estava me seguindo? Era ele o rosto por trás da máscara de esqui – se houvesse mesmo um rosto por trás da máscara? O que ele queria? Eu abracei meus cotovelos, de repente me sentindo muito gelada. Eu queria que a minha vida voltasse a ser do jeito que era antes de Patch entrasse de supetão na minha vida.

Ao final da aula, eu impedi Patch de ir embora. “Podemos conversar?”

Ele já estava de pé, então ele se sentou na beirada da mesa. “O que foi?”

“Eu sei que você não quer se sentar perto de mim mais do que eu quero me sentar perto de você. Eu acho que o Treinador pode considerar mudar os nossos assentos se você falar com ele. Se você explicar a situação –”

“A situação?”

“Nós não somos – compatíveis.”

Ele esfregou uma mão em sua mandíbula, um gesto calculado ao qual eu tinha me acostumado nos poucos dias que eu o conhecia. “Não somos?”

“Não estou anunciando notícias devastadoras aqui.”

“Quando o Treinador perguntou a minha lista de qualidades desejadas em uma companheira, eu dei você a ele.”

Minha boca caiu ligeiramente. “Retire o que disse.”

“Inteligente. Atraente. Vulnerável. Você discorda?”

Ele estava fazendo isso com o único propósito de me antagonizar, e isso só me irritava mais. “Você vai pedir ao Treinador para mudar os nossos assentos ou não?”

“Passo. Me afeiçoei a você.”

O que eu devia dizer a isso? Ele estava obviamente mirando para conseguir uma reação de mim. O que não era difícil, já que eu nunca conseguia dizer quando ele estava brincando, e quando ele estava sendo sincero.

Eu tentei injetar uma medida de equanimidade na minha voz. “Eu acho que você ficaria muito melhor sentado com outra pessoa. E acho que você sabe disso.” Eu sorri, tensa, mas educada.

“Acho que eu poderia acabar ao lado da Vee.” O sorriso dele parecia tão educado quando. “Não vou forçar a minha sorte.”

Vee apareceu do lado da nossa mesa, olhando entre mim e Patch. “Interrompendo algo?”

“Não,” eu disse, fechando a minha mochila com força. “Eu estava perguntando ao Patch sobre a leitura de hoje a noite. Eu não conseguia lembrar quais páginas o Treinador tinha passado.”

Vee disse, “A lição está no quadro, como sempre. Como se você já não tivesse lido-a.”

Patch riu, parecendo dividir uma piada particular com ele mesmo. Não pela primeira vez, eu desejei saber o que ele estava pensando. Porque as vezes eu tinha certeza que essas piadas particulares tinham tudo a ver comigo. “Algo mais, Nora?” ele disse.

“Não,” eu disse. “Vejo você amanhã.”

“Vou ficar esperando.” Ele piscou. Realmente piscou.

Após Patch estar fora de alcance, Vee agarrou meu braço. “Boas notícias. Cipriano. Esse é o sobrenome dele. Eu vi na lista de chamada do Treinador.”

“E isso é algo para se estar feliz porque...?”

“Todos sabem que os estudantes devem registrar remédios na enfermaria.” Ela puxou o bolso fronteiro da minha mochila, onde eu mantinha minhas pílulas de ferro. “Igualmente, todos sabem que a enfermaria está convenientemente

localizada no lado de dentro do escritório principal, onde, acontece, as fichas estudantis também são mantidas.”

Os olhos ardentes, Vee travou seu braço no meu e puxou-me na direção da porta. “Hora de fazer uma investigação de verdade.”
 
 
 
                                                 Capítulo 5
 
“POSSO AJUDÁ-LA?”


Eu me forcei a sorrir para a secretária do escritório principal, esperando não parecer tão desonesta quanto eu me sentia. “Eu tenho uma receita que tomo diariamente na escola, e minha amiga –”

Minha voz ficou presa na palavra, e eu me perguntei se depois de hoje eu chamaria Vee de minha amiga novamente.

“– minha amiga me informou que eu tenho que registrá-la com a enfermeira. Você sabe se isso está correto?” Eu não conseguia acreditar que estava parada aqui, pretendendo fazer algo ilegal. Ultimamente, eu estava exibindo muitos comportamentos não-característicos. Primeiro eu tinha seguido Patch para uma arcada de má reputação tarde da noite. Agora eu estava a beira de bisbilhotar seu arquivo estudantil. Qual era o meu problema? Não – qual era o problema do Patch, que quando se tratava dele, eu não conseguia parar de exercer maus julgamentos.

“Ah, sim,” a secretaria disse solenemente. “Todos os remédios precisam ser registrados. A enfermaria é aqui por trás, terceira porta à esquerda, do outro lado dos registros estudantis.” Ela gesticulou para o corredor atrás dela. “Se a enfermeira não estiver lá, você pode se sentar na cama portátil dentro do escritório dela. Ela deve voltar a qualquer minuto.”

Eu fabriquei outro sorriso. Eu realmente esperava que fosse ser tão fácil.

Dirigindo-me para o corredor, eu parei para diversas vezes para checar sobre meu ombro. Ninguém veio atrás de mim.

O telefone no escritório principal estava tocando, mas soava como um mundo distante do corredor turvo onde eu estava. Eu estava totalmente sozinha, livre para fazer o que eu desejava.

Eu parei com tudo na terceira porta à esquerda. Eu inspirei e bati, mas estava óbvio pela janela escura que a sala estava vazia. Eu empurrei a porta. Ela se moveu com relutância, abrindo com um rangido para uma sala compacta com azulejo branco desgastado. Eu fiquei de pé na entrada por um momento, quase desejando que a enfermeira aparecesse para que eu não tivesse escolha a não ser registrar minhas pílulas de ferro e ir embora. Um rápido olhar para o outro lado do corredor revelou uma porta com uma janela escrita REGISTROS ESTUDANTIS. Ela também estava escura.

Eu foquei minha atenção em um pensamento importunador no fundo da minha mente. Patch alegava que ele não tinha ido para escola no ano passado. Eu estava bem certa de que ele estava mentindo, mas se ele não estivesse, ele ao menos teria um registro estudantil? Ele teria um endereço residencial pelo menos, eu deduzi. E uma ficha médica, e as notas do último semestre. Ainda assim. Uma possível suspensão parecia um preço grande para pagar para espiar a ficha médica de Patch.

Eu inclinei um ombro contra a parede e chequei meu relógio. Vee me dissera para esperar pelo seu sinal. Ela disse que seria óbvio.

Ótimo.

O telefone no escritório principal tocou novamente, e a secretária atendeu.

Mastigando meu lábio, eu roubei uma segunda espiada na porta rotulada REGISTROS ESTUDANTIS. Havia uma boa chance dela estar trancada. Arquivos estudantis provavelmente com considerados de alta segurança. Não importava que tipo de distração Vee criasse, se a porta estivesse trancada, eu não entraria.

Eu mudei a minha mochila para o ombro oposto. Outro minuto passou. Eu disse a mim mesma que talvez devesse ir embora...

Por outro lado, e se Vee estivesse certa? E se Patch tivesse um passado criminal? Como sua parceira de biologia, contato regular com ele podia me colocar em perigo. Eu tinha uma responsabilidade de me proteger... não tinha?

Se a porta estivesse destrancada e os arquivos estivessem em ordem alfabética, eu não teria problema algum em localizar o arquivo de Patch rapidamente. Acrescente outros poucos segundos para folhear seu arquivo por algum sinal de perigo, e eu provavelmente poderia entrar e sair da sala em menos e um minuto. O que era tão breve que poderia parecer que eu não tinha entrado de modo algum.

As coisas tinham ficado estranhamente silenciosas no escritório principal. De repente Vee circulou a esquina. Ela se esgueirou pela parede na minha direção, andando agachada, arrastando suas mãos pela parede, roubando olhares clandestinos por sobre o seu ombro. Era o tipo de andar que espiões elaboravam em filmes antigos.

“Tudo está sob controle,” ela sussurrou.

“O que aconteceu com a secretária?”

“Ela teve que sair do escritório por um minuto.”

“Teve que? Você não a incapacitou, foi?”

“Não dessa vez.”

Graças a Deus pelas pequenas misericórdias.

“Eu alertei uma amiga de bomba do telefone público lá fora,” Vee disse. “A secretária ligou para a polícia, então correu para achar o diretor.”

“Vee!”

Ela bateu em seu pulso. “A hora está passando. Não queremos estar aqui quando os tiras chegarem.”

Nem me diga.

Vee e eu medimos a porta para os registros estudantis.

“Mexa-se,” Vee disse, batendo-me com seu quadril.

Ela abaixou sua manga sobre seu pulso e o bateu na janela.

Nada aconteceu.

“Isso foi só pra praticar,” ela disse. Ela recuou para dar outro soco e eu agarrei seu braço.

“Pode estar destrancada,” eu virei a maçaneta e a porta se abriu.

“Isso não foi tão divertido,” disse Vee.

Uma questão de opinião.

“Entra você,” Vee instruiu. “Eu vou ficar de vigilância. Se tudo correr bem, nós nos encontraremos em uma hora. Encontre-me no restaurante mexicano na esquina da Drake com a Beech.” Ela andou agachada pelo corredor.

Eu fiquei sozinha de pé parcialmente dentro e parcialmente fora da sala estreita alinhada à parede com armários. Antes que a minha consciência me convencesse, eu entrei e fechei a porta atrás de mim, pressionando as minhas costas contra ela.

Com um fôlego profundo, eu escorreguei a minha mochila e me apressei, arrastando meu dedo pela frente dos armários. Eu achei a gaveta marcada CAR-CUV. Com um puxão, a gaveta se abriu com uma pancada. As etiquetas nos arquivos estavam escritas a mão, e eu me perguntei se Coldwater High era a última escola no país não computadorizada.

Meus olhos passaram pelo nome “Cipriano.”

Eu puxei o arquivo da gaveta entupida com violência. Eu o segurei em minhas mãos por um momento, tentando me convencer que não havia nada de muito errado com o que eu estava prestes a fazer. E daí que havia informações confidenciais dentro? Como parceira de biologia do Patch, eu tinha o direito de saber dessas coisas.

Do lado de fora, vozes encheram o corredor.

Eu remexi no arquivo aberto e imediatamente recuei. Não fazia sentido algum.

As vozes avançaram.

Eu enfiei o arquivo ao acaso dentro da gaveta e dei um empurrão, fazendo-a agitar-se de volta no armário. Enquanto eu me virava, eu congelei. Do outro lado da janela, o diretor estava parado a meio caminho, seu olhar fechando-se sobre mim.

O que quer que ele estivera dizendo para o grupo, que consistia de todos os maiores membros do conselho da escola, dissipou-se. “Me dêem licença por um instante,” eu o ouvi dizer. O grupo continuou acotovelando-se para frente. Ele não.

Ele abriu a porta. “Essa área é fora dos limites para estudantes.”

Eu coloquei uma cara indefesa. “Eu sinto tanto. Estou tentando achar a enfermaria. A secretária disse que era a terceira porta a direita, mas eu acho que contei errado...” Eu joguei minhas mãos para cima. “Estou perdida.”

Antes que ele pudesse responder, eu puxei com violência o zíper da minha mochila. “Eu deveria registrá-las. Pílulas de ferro,” eu expliquei. “Eu sou anêmica.”

Ele me estudou por um momento, sua testa enrugando. Eu achei que conseguia vê-lo pesando suas opções: ficar por aqui e lidar comigo, ou lidar com a ameaça de bomba. Ele sacudiu seu queixo porta afora. “Eu preciso que você saia do prédio imediatamente.”

Ele sustentou a porta aberta e eu me abaixei por debaixo do seu braço, meu sorriso sofrendo um colapso.

***

Uma hora mais tarde eu deslizei numa cabine de canto no restaurante mexicano na esquina do Drake com a Beech. Um cacto de cerâmica e um coiote empalhado estavam na parede acima de mim. Um homem usando um sombrero mais largo do que ele era alto passou vagueando. Dedilhando cordas em seu vidão, ele me fez uma serenata enquanto o hostess colocava cardápios na mesa. Eu franzi a testa para o símbolo no copo da frente. The Borderline. Eu não tinha comido aqui antes, mas ainda assim algo no nome me soava vagamente familiar.

Vee surgiu atrás de mim e caiu no assento oposto. Nosso garçom seguia de perto.

“Quatro chimis15, creme de leite extra, uma porção de nachos, e uma porção de feijões pretos,” Vee disse a ele sem consultar o cardápio.

“Um red burrito16,” eu disse.

“Contas separadas?” ele perguntou.

“Eu não vou pagar por ela,” Vee e eu dissemos ao mesmo tempo.

Após o nosso garçom ir embora, eu disse, “Quatro chimis. Estou ansiosa em ouvir a conexão com uma fruta.”

“Nem começa. Eu estou morrendo de fome. Não comi desde o almoço.” Ela pausou. “Se não contar os Hot Tamales, o que eu não conto.”

Vee é voluptuosa, com complexo escandinávio, e de um jeito heterodoxo, incrivelmente sexy. Houvera dias onde a nossa amizade era a única coisa no caminho da minha inveja. Perto da Vee, a única coisa que eu tenho a meu favor são as minhas pernas. E talvez meu metabolismo. Mas definitivamente não o meu cabelo.

“É melhor que ele traga chips logo,” disse Vee. “Eu vou ficar com urticária se eu não comer algo salgado nos próximos quarenta e cinco segundos. E de qualquer jeito, as primeiras três letras na palavra dieta17 devem te informar o que eu quero que aconteça a ela.”

“Eles fazem salsa com tomate,” eu apontei. “É vermelho. E abacates são frutas. Eu acho.”

Seu rosto se iluminou. “E vamos pedir daiquiris de morango.”

Vee estava certa. Essa dieta era fácil.

“Já volto,” ela disse, deslizando para fora da cabine. “Aquele período do mês. Depois disso, eu quero o furo.”

Enquanto esperava por ela, eu me encontrei concentrada no assistente de garçom há algumas mesas. Ele estava trabalhando arduamente esfregando um pano sobre o topo de uma mesa. Havia algo estranhamente familiar no jeito com que ele se movia, no jeito que sua camisa caia sobre o arco de suas costas bem definidas. Quase como se ele suspeitasse que estava sendo observado, ele se endireitou e se virou, seus olhos fixos nos meus no exato momento em que eu descobri o que era tão familiar nesse assistente de garçom em particular.

Patch.

15 Abreviação de chimichanga. É feito a partir de tortilhas, e tem ingredientes como feijão, arroz, queijo, carne moída, tiras de carne, carne em conserva ou tiras de frango. É então frito e servido com salsa, guacamole, creme de leite e/ou queijo.

16 Feito com carne moída, arroz mexicano, feijões refritos e salsa robusta – tudo enfiado em uma tortilha quente. Então é colocado um molho apimentado e queijo cheddar derretido.

17 Primeiras 3 letras = die, 'morra' em português.

Eu não conseguia acreditar nisso. Eu pensei em dar um tapa na minha testa quando eu me lembrei que ele tinha me contado que trabalhava na Borderline.

Enxugando suas mãos em seu avental, ele andou até aqui, aparentemente gostando do meu desconforto enquanto eu procurava ao redor por alguma maneira de escapar, descobrindo que eu não tinha lugar algum para ir a não ser para mais dentro da cabine.

“Ora, ora,” ele disse. “Cinco dias por semana não é o bastante de mim? Tinha que me ceder uma noite também?”

“Eu peço desculpas pela infeliz coincidência.”

Ele deslizou no assento da Vee. Quando ele abaixou seus braços, eles eram tão longos que cruzavam na minha metade da mesa. Ele alcançou o meu copo, girando-o em suas mãos.

“Todos os assentos aqui estão tomados,” eu disse. Quando ele não respondeu, eu peguei meu copo de volta e tomei um gole d’água, engolindo acidentalmente um cubo de gelo. Queimou o caminho todo. “Você não deveria estar trabalhando, ao invés de fraternizando com os clientes?” eu engasguei.

Ele sorriu. “O que você vai fazer domingo a noite?”

Eu bufei. Por acidente. “Você está me chamando para sair?”

“Você está ficando metida. Eu gosto disso, Anjo.”

“Eu não ligo para o que você gosta. Eu não vou sair com você. Não em um encontro. Não sozinha.” Eu queria me chutar por ter sentido um tremor quente ao especular o que uma noite sozinha com Patch poderia trazer. Era mais provável que ele nem quisesse ter dito isso. Era mais provável que ele estivesse me sondando por razões conhecidas só por ele próprio. “Espera aí, você acabou de me chamar de Anjo?” eu perguntei.

“E se eu chamei?”

“Eu não gosto.”

Ele sorriu. “Vai ficar. Anjo.”

Ele se inclinou sobre a mesa, levantou sua mão para o meu rosto, e roçou seu dedão pelo canto da minha boca. Eu me afastei, tarde demais.

Ele esfregou gloss labial entre seu dedão e seu indicador. “Você ficaria melhor sem isso.”

Eu tentei lembrar do que estávamos falando, mas não tão arduamente quanto eu tentei parecer impassível ao seu toque. Eu joguei meu cabelo para trás sobre o meu ombro, pegando o fio da nossa conversa anterior. “De qualquer jeito, eu não posso sair em noites de escola.”

“Que pena. Tem uma festa na costa. Achei que pudéssemos ir.” Ele realmente soou sincero.

Eu não conseguia entendê-lo. Não mesmo. O tremor quente de antes ainda prolongava-se no meu sangue, e eu tomei um longo gole do meu canudo, tentando esfriar meus sentimentos com uma dose de água gelada. Tempo sozinha com Patch seria intrigante, e perigoso. Eu não tinha certeza de como exatamente, mas eu estava confiando nos meus instintos nessa.

Eu fingi um bocejo. “Bem, como eu disse, é uma noite de escola.” Na esperança de convencer a mim mesma mais do que ele, eu acrescentei, “Se essa festa é algo na qual você está interessado, eu posso quase garantir que eu não estarei.”

Pronto, eu pensei. Caso encerrado.

E então, sem nenhum aviso qualquer, eu disse, “Por que você está me chamando, de qualquer jeito?”

Até esse momento, eu fiquei dizendo a mim mesma que não ligava para o que Patch pensava de mim. Mas agora, eu sabia que era uma mentira. Mesmo que isso provavelmente voltasse para me assombrar, eu estava curiosa o bastante sobre Patch para ir a quase qualquer lugar com ele.

“Eu quero ficar com você a sós,” Patch disse. Bem dessa maneira, minhas defesas atacaram.

“Escuta, Patch, eu não quero ser rude, mas –”

“Claro que quer.”

“Bom, você começou!” Adorável. Muito maduro. “Eu não posso ir na festa. Fim de papo.”

“Por que você não pode sair em uma noite de escola, ou por que você tem medo de ficar sozinha comigo?”

“Ambos.” A confissão simplesmente escorregou de mim.

“Você tem medo de todos os caras... ou só de mim?”

Eu girei meus olhos, como se para dizer que não ia responder uma pergunta tão insana.

“Eu te deixo desconfortável?” Sua boca permaneceu uma linha neutra, mas eu detectei um sorriso de especulação preso atrás dela.

Sim, na verdade, ele tinha esse efeito em mim. Ele também tinha a tendência de apagar todos os pensamentos lógicos da minha mente.

“Me desculpe,” eu disse. “Sobre o que estávamos falando?”

“Você.”

“Eu?”

“A sua vida pessoal.”

Eu ri, incerta de que outra resposta dar. “Se isso for sobre mim... e o sexo oposto... Vee já fez esse discurso. Não preciso ouvi-lo duas vezes.”

“E o que a velha e sábia Vee disse?”

Eu estava brincando com as minhas mãos, e as deslizei para fora de visão. “Não consigo imaginar o por que de você estar tão interessado.”

Ele balançou suavemente sua cabeça. “Interessado? Estamos falando de você. Estou fascinado.” Ele sorriu, e foi um sorriso fantástico. O efeito foi uma pulsação avassaladora – a minha pulsação avassaladora.

“Eu acho que você deveria voltar ao trabalho,” eu disse.

“Se é que isso conta, eu gosto da ideia de que não haja um cara na escola que corresponda às suas expectativas.”

“Eu esqueci que você é a autoridade das minhas supostas expectativas,” eu fiz troça.

Ele me estudou de um jeito que me fez parecer transparente. “Você não é cautelosa, Nora. Não é tímida, tampouco. Você só precisa de uma razão muito boa para sair do seu caminho para conhecer alguém.”

“Eu não quero mais falar de mim.”

“Você acha que desvendou tudo.”

“Não é verdade,” eu disse. “Por exemplo, bem, assim, eu não sei muito sobre... você.”

“Você não está pronta para me conhecer.”

Não havia nada de leve no jeito como ele disse isso. De fato, sua expressão era afiada como uma navalha.

“Eu olhei no seu arquivo estudantil.”

Minhas palavras pairaram no ar por um instante antes que os olhos de Patch se alinhassem com os meus. “Estou bastante certo de que isso é ilegal,” ele disse calmamente.

“Seu arquivo estava vazio. Nada. Nem mesmo uma ficha médica.”

Ele não fingiu parecer surpreso. Ele relaxou de volta em seu assento, os olhos brilhando obsidianamente. “E você está me contando isso porque tem medo que eu cause um surto? Sarampo, ou caxumba?”

“Estou te contando isso porque eu quero que você saiba que eu sei que algo sobre você não é certo. Você não enganou a todos. Eu vou descobrir o que você está aprontando. Eu vou te expor.”

“Estou ansioso por isso.”

Eu corei, captando a insinuação tarde demais. Por sobre a cabeça do Patch, eu consegui ver a Vee tecendo seu caminho pelas mesas.

Eu disse, “Vee está vindo. Você tem que ir.”

Ele ficou no lugar, olhando-me, considerando.

“Por que está me olhando desse jeito?” eu desafiei.

Ele inclinou-se para frente, preparando-se para levantar. “Porque você não é nem um pouco como eu esperava.”

“Nem você,” eu reagi. “Você é pior.”

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